segunda-feira, 6 de julho de 2015

Flip, termômetro da crise

Há uma coisa muito triste, que é a transformação da cúpula do Partido dos Trabalhadores; e não estou dizendo que não há pessoas honestas, claro que há; mas há uma transformação numa cúpula de gente corrupta que trabalha num esquema mafioso e de gangue
Boris Fausto

Em um ano de crise política e econômica, a Festa Literária de Paraty não ficou alheia aos entraves e contradições brasileiras. Declarações fortes sobre escravidão, corrupção, colonialismo e outros aspectos do passado e do presente brasileiros apareceram nas encontros de autores dos dois dias mais nobres da festa, sexta-feira e sábado. Tudo sempre mediado pela literatura, com seus alcances e limitações diante da vida cotidiana.

O respeitado historiador brasileiro Boris Fausto (84), que nunca havia participado de uma Flip, abriu a programação de sábado para falar do livro de memórias – O brilho do bronze (Cosac Naify) – que escreveu sobre sua esposa, a educadora Cynira Stocco Fausto, morta por um câncer em 2010. Comoveu os presentes com memórias relatadas de maneira sensível, mas foi capaz de provocá-los ainda mais quando fez comentários políticos bastante críticos, entrevistado pelo jornalista Paulo Roberto Pires.

"A partir da entrada do PT no governo houve momentos de razoável equilíbrio financeiro combinados com a possibilidade de realizar um equilíbrio social. Mas a partir do segundo governo Lula houve uma política econômica inadequada, ideológica, que levou a esse quadro. Levou à cúpula do partido uma cúpula de corruptos, um sistema mafioso gigante", afirmou, sob aplausos calorosos. Sobre o PSDB, também não economizou declarações fortes: "A oposição não tem conseguido ser oposição. Não tem coragem de dizer que é contra a corrupção que se instalou, que é um partido de classe média. Falta coerência. Uma alternativa seria muito importante nesta situação, mas infelizmente não temos”.

Em seguida, a ensaísta argentina Beatriz Sarlo e a jornalista portuguesa Alexandra Lucas Coelho subiram ao palco da tenda principal com a missão de partir de "Turistas aprendizes" – livro do homenageado do evento, Mário de Andrade – para falar de suas experiências de viagem, relatadas respectivamente nos títulos "Viagens: da Amazônia às Malvinas" e "Vai, Brasil", ambos recém-publicados no Brasil. O discurso de ambas despertou interesse ainda maior quando passou à corrupção, no caso de Sarlo, e ao colonialismo, no de Coelho.

"Há um caminho de esperança no Brasil, porque a Justiça está atuando contra a corrupção. Em meu país, o vice-presidente está enfrentando um processo e mesmo assim não deixou o cargo. A corrupção é condenável em todas as suas formas, mas no Brasil vejo mais esperança para resolver esse problema”, opinou a argentina. Já a portuguesa, que atuou como correspondente do Público, jornal de Portugal, no Oriente Médio e no Rio de Janeiro, confessou: “Precisei dar a volta no mundo e lidar com o colonialismo dos outros para chegar ao Brasil e conhecer 500 anos de história viva que têm relação com o país de onde eu vim”.

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