terça-feira, 19 de agosto de 2014

Enquanto a luz não vem

Nunca gostou de livros. É um fato. “Ler dá um sono danado”, sempre disse. Em seu benefício, nunca mentiu, pelo menos no que se tratava de seu desprezo natural, quase patológico, pelos livros.

O destino, sendo irônico e talvez carecendo de bom gosto, quis que a vida lhe entregasse o poder. Caminho difícil, possivelmente admirável, durante o qual teve o apoio justamente daqueles que tiveram na leitura a razão do seu sucesso. Coisas da vida.
No poder, revelou seu desapreço também pelos jornais. Causavam, segundo ele, desarranjos estomacais. “Dá azia”, diagnosticou. Havia alguma controvérsia sobre a veracidade do diagnóstico.

Os aliados, talvez atribuíssem a sensibilidade gastrointestinal a uma possível alergia a tinta ou ao papel. Hipótese eventualmente desmentida quando a palavra impressa passou a chegar por meios digitais.

Na inexistência de explicações clinicas, restou o fato de que a causa da azia eram as ideias. Ou melhor, o horror a sua diversidade. Ficou evidente o asco que lhe causava ver impressas, expostas e lidas, as ideias, opiniões e fatos que pudessem de alguma maneira, contraria-lo.

A inteligência e o espirito prático, mais uma vez não lhe faltaram. Para combater diversidade de ideias, concluiu ele, a melhor estratégia seria desestimular o pensamento. Iniciou o culto à ignorância.
Ignorância, não seria obstáculo a ser superado. Ao contrário, seria característica ou virtude a ser preservada ou mesmo cultivada. Desestimulou a leitura, o estudo e a cultura como ferramentas necessárias ao sucesso individual ou coletivo.

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