terça-feira, 8 de outubro de 2019

Estado, desigualdade e crescimento

Todos os governos e sociedades deveriam buscar um modelo de desenvolvimento que conjugasse crescimento econômico, estabilidade, sustentabilidade e justa distribuição de renda. Nem sempre isso ocorre. No Brasil a desigualdade é extrema. Temos a maior concentração de renda, medida pelo índice de Gini, se comparados com todos os países integrantes da OCDE.

Isso tem levado especialistas a mergulhar no debate sobre as raízes da desigualdade no Brasil e das alternativas de mudança. É o caso do economista e ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, que produziu recentemente interessante estudo que leva o título deste meu artigo e vale a pena ser lido e debatido.

A preocupação central é atacar as desigualdades para “deslanchar um círculo virtuoso de crescimento inclusivo e sustentável”, começando por desfazer a falsa contradição entre crescimento e distribuição de renda, oportunidades e riqueza.




O problema é que não só a desigualdade é escandalosa, mas é permanentemente reproduzida por mecanismos institucionais e informais. Exemplo disso é que os dois maiores sistemas públicos, o previdenciário e o tributário, são regressivos. Dito de outra forma, transferem renda dos mais pobres para os mais ricos.

O estudo aponta que as reformas previdenciária, tributária e do Estado e a redução de subsídios e gastos tributários poderiam, ao longo de alguns anos, economizar 9% do PIB. Do fim da Segunda Guerra Mundial a 1979, a renda per capita brasileira dobrou em relação à dos EUA. Mas a crise do petróleo e o choque de juros internacionais foram fatais. E começamos a patinar numa sucessão de crises inflacionárias e de balanço de pagamento, insistindo no erro de apostar no fechamento da economia e na forte intervenção estatal e dando pouca ênfase a educação, produtividade e igualdade. A desigualdade caiu, a partir de 1988, fruto da nova Constituição e das políticas sociais dos governos FHC e Lula, notadamente a valorização do salário mínimo, a melhoria dos indicadores de saúde e a criação de programas como o Benefício de Prestação Continuada (idosos e pessoas com deficiência) e o Bolsa Família. Mas estudos recentes mostram que a queda da desigualdade foi menor do que se imaginava.

A má qualidade dos serviços públicos, a grande informalidade no mercado de trabalho e os raquíticos níveis de cobertura no saneamento retratam um quadro social dramático. Soma-se a isso a desigualdade de oportunidades, notadamente na área educacional, e a captura do aparato governamental por interesses patrimonialistas.

Armínio Fraga identifica ser possível diminuir drasticamente subsídios diretos e indiretos, introduzir mudanças na tributação da renda da pessoa física e da renda do capital, ampliar a tributação sobre heranças segundo padrões internacionais, combater a informalidade no mercado de trabalho e reduzir as taxas de juros, propiciando uma economia de 9% do PIB, que poderiam ser distribuídos na geração de superávit primário para estancar o agravamento da situação fiscal e do endividamento (3%) e no aumento de investimentos sociais, em pesquisa e infraestrutura (6%).

As escolhas são políticas. Cabe a todos nós escolher qual o trecho do hino nacional vamos cantar: permanecer “deitado em berço esplêndido” ou mostrar que o “filho teu não foge à luta”.

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