terça-feira, 10 de outubro de 2017

Viciados em dinheiro

Não deu outra: o presidente postiço Michel Temer vetou artigos da nova Lei Eleitoral (“Reforma Política” uma ova!) que limitavam a contribuição individual para as campanhas. Tirou o que fixava em no máximo 10 salários mínimos essa doação. Fica mantido, então, o farto “teto” de 10% da renda bruta do doador, para os milionários presentearem à vontade seus candidatos.

Temer também acabou com a restrição ao autofinanciamento, de 7% do teto para cargos proporcionais e de vultosos R$ 200 mil para os cargos majoritários. Agora o candidato pode usar seus próprios recursos até o total possível para o cargo que disputa.


Estão sendo chamados de “vetos Doria”, alusão ao prefeito milionário – aquele que vez em quando visita São Paulo – doador de R$ 4,4 milhões para sua própria campanha.

Esses tetos, aliás, foram inseridos na Lei, contra a reclamação de nós poucos. Eles são chocantes para a realidade social do país: R$ 70 milhões para presidente, R$ 21 milhões para governadores, R$ 5,6 milhões para senadores, R$ 2,5 milhões para deputados federais, R$ 1 milhão para estaduais.

Seus defensores dizem que estão bem abaixo do que se gastou nas eleições de 2014. Mas aqueles valores eram o ponto máximo da degradação mercantilista do sistema eleitoral do país, nutrido pelo conluio corrompido de grandes empresas e partidos políticos. Não servem de parâmetro!

Quanto aos vetos de Temer, é improvável derrubá-los quando forem apreciados. Mas, pelo evidente abuso do poder econômico, que fica assim viabilizado, é preciso instar o Tribunal Superior Eleitoral a estabelecer limites mais austeros, na regulamentação do pleito. E, em última instância, recorrer ao Supremo.

Norberto Bobbio (1909-2004) explicitou com precisão o mercado do voto. O que funcionou na Itália (e ainda funciona, apesar da “Mãos Limpas”) vale para o Brasil:

“Um dos modos de conquistar votos é comprá-los e um dos modos para se livrar das despesas é servir-se do poder conquistado para conseguir benefícios dos que possam receber vantagens desse poder. Considerada a arena política como uma forma de mercado, onde tudo é coisa comprável e vendível, o político se apresenta num momento como comprador (do voto), e num segundo momento como vendedor (dos recursos públicos dos quais, graças aos votos obtidos, se tornou potencial dispensador)” (L´Utopia Capovolta, 1990).

Se não fizermos uma mudança radical no modo de financiar as campanhas e na forma de fazê-las, de maneira que o tamanho das ideias valha mais que o tamanho do bolso, continuaremos ladeira abaixo. E as próximas eleições garantirão a continuidade da cleptoburocracia nos Poderes Executivos e Legislativos, estaduais e nacional. Nova roupagem no mesmo corpo doentio e já em putrefação.

PS: impossível não registrar a aguda dor diante da mortandade na creche Gente Inocente, em Janaúba (MG). Só uma fé algo louca pode trazer algum conforto. Pequeno consolo é ver que as lágrimas que a cidade inteira derrama são também de emocionado orgulho por existirem pessoas como a pedagoga Helley Batista, que deu a vida por suas crianças.

Nenhum comentário:

Postar um comentário