Vivi 12 anos sob Michael Bloomberg, o bilionário self-made man que se apresentava como gestor e chegou com a teatralidade usada por políticos que dizem não ser políticos. Bloomberg estreou tomando o metrô de sua mansão espetacular na Rua 79 para a prefeitura e foi capa de tabloides. Poucos prestaram atenção ao detalhe de que, na Nova York pós-11 de setembro, ter um prefeito espremido nos vagões na hora do rush implicava mais despesa com segurança. Enquanto ele sugeria, com rudeza notória, que os nova-iorquinos parassem de reclamar de um dos piores sistemas de metrô do mundo desenvolvido, um S.U.V. blindado apanhava o prefeito na porta de casa e o depositava numa estação 20 quarteirões adiante, a que tinha a linha expressa.
Na sede da prefeitura, ele derrubou paredes e sentava no meio de uma sala cheia de mesas para promover transparência. Mas, quando chegava sexta-feira, o alcaide-gestor sumia. Pegava o jato particular e não sabíamos se estava descansando numa praia pública de Long Island ou na sua mansão espetacular nas Bahamas. Adivinhem onde estava. A metrópole ocidental então mais visada pelo terrorismo tinha um prefeito que saía do país frequentemente sob o argumento de que sua folga, no Bronx ou nas Bahamas, não era da conta de ninguém. Até que a mãe natureza, quiçá ciente de que governo não é gestão, despejou aqui uma nevasca épica, destas que requerem alertas constantes sobre medidas de emergência e fecham aeroportos. E o prefeito, como os leitores já deduziram, não estava no Bronx. Decolou um dia depois e enfrentou as câmeras com um sorriso amarelo.
Mas, se o desprezo do bilionário Bloomberg pela política lhe custou a candidatura à presidência com a qual sonhou até 2012, o homem tinha um talento óbvio de gerente. Seu antecessor, o untuoso neotrumpista Rudolph Giuliani, vivia às turras com os líderes negros locais e tratava o Harlem como nação estrangeira. Bloomberg desprezava drama e logo saiu conversando com os esnobados por Giuliani. Não chamava ninguém de safado. Engolia sapos de demagogos populistas que havia de desprezar, desde que manter canais abertos produzisse resultados tangentes. Quando era criticado e, convenhamos, o nova-iorquino faz exigência até de defunto, não recorria a um espantalho, fazendo discurso grosseiro contra um ex-presidente fora do cargo há anos. Bloomberg sabia a diferença entre campanha e governo. Ele se dirigia a todos os nova-iorquinos porque, uma vez eleito, é o que se espera do governante.
A desconfiança da política produz abstinência eleitoral crescente e apatia. Entram em cena os profetas da antipolítica, neopopulistas que usam a rede social para se manter em campanha permanente, testam a etiqueta tradicional dos cargos que ocupam, demitem membros do gabinete pelo Facebook. Com acesso fácil a recursos digitais, atacam jornalistas pessoalmente. A gritaria do ex-presidente contra uma rede de TV e os ataques do atual prefeito paulistano a este ou aquele jornalista têm origem no mesmo impulso. Estamos na era do partidarismo negativo, o governar contra algo ou alguém. Se tática similar fosse aplicada numa empresa, o aprendiz certamente não ouviria a frase, “Você está contratado.”
Lúcia Guimarães
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