Rompeu, com antecedência de alguns séculos, os paradigmas sociais, políticos e culturais de seu tempo. Sem inventar nada. Apenas adotando o Sermão da Montanha como filtro de seu olhar, fez uma crítica penetrante ao sistema vigente em sua época, à forma de governar e dominar as massas. Mostrou que as vias da não violência e o respeito à verdade são imprescindíveis para uma sociedade harmoniosa.
O livro desapareceu de circulação, queimado nas fogueiras, e foi reeditado apenas em 1988, quando inspirou os movimentos de ecologistas, pacifistas, intelectuais do bem que anseiam pela sobrevivência da humanidade num modelo sustentável e universal. O livro se mantém atual como nunca, mereceria ser estudado nas escolas e estar na cabeceira dos homens de poder, especialmente dos políticos que, ao assumirem um mandato, anseiam pelo bem-estar de uma nação sem prejudicar as demais.
“Veja quanto é inútil e injusto recolher impostos do povo trabalhador para enriquecer funcionários (ocupantes de cargos públicos) ociosos”, apostrofou Tolstói.
“Quanto mais alta é a posição de um homem na hierarquia corrompida, tanto mais instável (e nociva) sua presença, pois ele tem fé na duração ilimitada da organização (criminosa) existente, que lhe permite cometer barbaridades com a maior e a mais perfeita tranquilidade de espírito, como se não agisse em seu proveito (para se locupletar)... Essa é a situação quase comum dos funcionários (do Estado) que ocupam posições mais lucrativas (e estratégicas) de quanto poderiam ocupar em outra organização (por mérito real e pessoal)”, escreveu no ano de 1894.
“Na função pública, a tendência (de exploração do poder) se estende do mais humilde policial à mais alta autoridade”, anotando, infelizmente, que o poder se presta aos interesses pessoais. O governo defende a cobrança de impostos para atender a saúde pública, mas não se esforça hoje, no Brasil contemporâneo, para livrar-se da corrupção que o devasta. Insiste em cobrar mais, quando poderia primeiramente gastar menos cortando os desvios monumentais.
Bilhões são subtraídos na forma de impostos para aplicar em aposentadorias injustas, privilégios descabidos para autoridades. Práticas que apenas sobrevivem no Brasil quebrado e castigado por filas infindáveis no atendimento.
Outros bilhões são desviados cinicamente, com juros da dívida, de obras públicas desnecessárias, da merenda escolar, do programa Bolsa Família, num país que enfrenta parcela assustadora de crianças e jovens sem alimentação suficiente e que, bem por isso, pagam com graves prejuízos em sua formação.
Escreveu Tolstói há 122 anos: “A corrupção consiste em tomar do povo suas riquezas por meio de impostos e distribuí-las às autoridades constituídas, que se encarregam de manter e aumentar a opressão (e o desserviço). Essas autoridades compradas, desde os ministros até os escreventes, formam uma invencível união pelo mesmo interesse: viver em detrimento do povo. Enriquecer, tanto mais quanto maior é a submissão” aos esquemas perversos que exploram o poder.
Para chegar a isso, observa que é o “hipnotismo” do povo, que consiste em deter o desenvolvimento moral dos homens, com diversos métodos, inserindo o arcaico conceito de vida materialista, apegada a vícios, superstições e prazeres ilusórios.
Faleceu como “subversivo excomungado”, pregando que os “deveres de cidadão devem ser subordinados aos deveres superiores da vida eterna de Deus” e lembrando, do Atos dos Apóstolos (5, 29): “É preciso obedecer antes a Deus que aos homens”.
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