O sociólogo e criminalista americano Edwin Sutherland, autor do clássico “White-Collar Crime”, nos anos 40, propõe penas mais rigorosas quanto aos criminosos públicos em relação aos criminosos individuais, tendo em vista que o crime público atinge diretamente o coletivo e, portanto, potencializa enormemente seus efeitos perversos e muitas vezes devastadores: a vítima é multiplicada por centenas, milhares, milhões e até bilhões de indivíduos, como nos crimes ambientais e nucleares.
A repugnância coletiva que move hoje a sociedade brasileira contra esse tipo de indivíduo que tem pontificado na vida política, em todos os níveis e poderes, decorre desse sentimento transcendental coletivo de repulsa à rapina da coisa pública por grupos de indivíduos e até por bandoleiros solitários preocupados apenas em encher as próprias burras com o que é coletivo e suportado por tributos dos cidadãos. É o singular furtando do que é plural. O privado assaltando o que a todos pertence.
Partidos políticos de encomenda e seus chefes flibusteiros perderam completamente o compromisso republicano e dedicam-se hoje aos métodos mais sórdidos de apropriação dos cofres do Estado e suas companhias públicas, partilhando essas carcaças dos exauridos corpos como se verdadeiros abutres fossem.
Roubar do Erário se transformou na regra, no objetivo mater da atividade pública, estabelecendo normas de certa omertà entre os larápios que o instituto da colaboração judicial premiada tenta desmontar. Daí o seu papel fundamental que tanto tem escandalizado os criminalistas ortodoxos, colocando-os em oposição a uma novíssima geração de juízes, promotores públicos e policiais federais.
O caso da saúde pública no Estado do Rio de Janeiro é emblemático. Roubou-se à farta na principal estatal de petróleo brasileira, sediada não por acaso na capital do estado. O Rio é o maior produtor de petróleo do Brasil, absolutamente dependente de seus royalties, e onde estão localizadas suas maiores reservas. Empenhados no assalto aos cofres da estatal que estavam seus gestores e planejadores, hoje atrás das grades, sob o olhar complacente e distante da presidente de seu Conselho de Administração e atual “presidenta” da República, não se deram conta de que os preços internacionais da commodity despencariam no mercado internacional e praticaram todo tipo de insensatez, para dizer o mínimo.
Estavam todos hipnotizados pelos fantásticos recursos submersos do pré-sal, delirantemente acalentados pela “nova matriz econômica”, saída dos cérebros privilegiados do lulopetismo de cooptação. Resultado: a saúde pública e os serviços do Estado em geral, até mesmo a folha de pagamentos dos servidores públicos estaduais, entraram em colapso e o governador foi obrigado a decretar “estado de emergência”, correndo para o colo da União, de tetas já bem murchas pela desordem fiscal e pela corrupção generalizada.
Todo o projeto desenvolvimentista dessa “nova matriz” fundou-se nessa falta de planejamento mínimo estratégico, entre outros setores, quanto ao petróleo e à Petrobras. A literatura especializada na matéria já afirmava que o combustível fóssil está com seus dias contados por esgotamento das fontes, por seus efeitos deletérios sobre a biodiversidade ou por retração natural da economia mundial, como está a suceder. Ou mesmo por esses três fatores combinados.
Mas os predadores da República fizeram ouvidos moucos. E continuam no poder e a mandar nos destinos da nação com essa visão deletéria. Não se sabe se esta mesma nação terá resistência para continuar convivendo com tal sangria. O povo já se exaspera nas portas dos hospitais sucateados e os xinga pelos aeroportos e restaurantes. Até quando?
Nelson Paes Leme
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