quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Nunca se torturou tanto neste país


A propósito da morte do coronel Ustra, por que existe essa fixação em torturadores do passado, quando pessoas são torturadas no presente em cada hospital, em cada delegacia, em cada periferia, em cada presídio? Não seria mais lógico, ao invés de correr atrás de mortos e torturadores do passado, primeiro impedir que a tortura continue a ocorrer no presente?

Primeiro o governo deve impedir que a tortura persista sob as suas barbas. Depois, prender os torturadores que insistam na prática desumana. Aí, sim! Quando o país estiver com a história atual limpa de tortura, poderemos mandar a deputada Maria do Rosário investigar e prender os torturadores do passado…

O resto, a meu ver, é apenas holofote para desviar o foco da calamitosa situação atual.

Uma maneira de induzir os incautos é alardear que o Brasil está melhor (no que se refere ao respeito à vida) do que na época do Ustra. Mas não é verdade. A crença deriva do fato de que os atuais torturados não têm sobrenome famoso ou não são da classe média/alta que gosta de ficar em evidência na mídia, discutindo sociologia e sexualidade…

Os brasileiros das elites (classe média alta em diante) precisam conhecer os hospitais públicos, talvez para fazer uma doação de sangue ou uma simples visita, ainda que seja “eclesiástica”, para lLevar uma palavra de consolo…

Assim, veriam idosos, homens, mulheres e crianças morrendo em abandono. Fico pensando nas pessoas que já vi morrer (e nas que ainda vão morrer) nos Hospitais do Distrito Federal. Jogados em uma maca imunda, pelas enfermarias e corredores, com um soro na veia para dizer que estão sendo atendidos, com fluxo regulado para durar quatro horas ou mais… Sem médico e sem enfermeira… Quantos?

Neste ano, vi Dona Yolanda, uma senhora com 86 anos de idade, ficar quinze dias deitada sobre uma cama no Hospital Regional de Sobradinho, tomando banho de toalha molhada, dado por uma das filhas. Ela havia fraturado o fêmur em uma queda. A última vez que a visitei estava com a coxa toda roxa e ainda não havia perspectiva de a cirurgia ser feita, por falta de médico e/ou de sala cirúrgica disponíveis! Quando tinha uma coisa, faltava outra. Isso não seria uma forma de tortura?

Se algum coágulo tivesse de desprendido do ferimento, no Laudo Cadavérico não constaria o tempo que ela ficou presa a uma cama esperando o atendimento, nem responsabilizaria os responsáveis. Constaria apenas “embolia pulmonar”, por exemplo, e ponto final.

Nunca se torturou tanto neste país (nem entrarei no caso da penitenciária de Pedrinhas…). Não se deve inocentar os torturadores do passado, mas prender os torturadores do presente!

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