quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Hoje, 6 de agosto, é dia de homenagear um herói brasileiro: o major Plácido de Castro

É decepcionante constatar que o Brasil não cuida de sua memória. Se você perguntar a algum historiador brasileiro sobre o dia 6 de agosto, possivelmente ele não lembrará do que se trata.Se for estudioso da História das Américas, poderá lembrar que foi em 6 de agosto que Simón Bolívar entrou em Caracas, após a vitória de Taguanes, e recebeu o título honorífico de Libertador, e 12 anos depois, também num 6 de agosto, Bolívar declarou a independência do país que levou seu nome, a Bolívia.

Mas dificilmente o historiador se lembrará do que deveria significar o 6 de agosto para os brasileiros, por ser a data em que se iniciou a revolução que culminou na anexação do Acre ao território nacional, livrando a Amazônia da possibilidade de ser colonizada pelo Império britânico, que na época (1902) dominava a maior parte do mundo e estava tentando usurpar a Amazônia com apoio dos Estados Unidos, que começava a ser firmar como grande potência.

Naquele início de século XX, a borracha já se tornara uma das mais estratégicas matérias-primas, e toda a produção mundial provinha de um só lugar, a Amazônia, onde a nativa hevea brasiliensis vicejava com maior abundância justamente no território boliviano do Acre, uma extensa região que desde 1870 vinha sendo colonizada por brasileiros, que emigravam para viver da borracha. Lá havia seringueiros e aventureiros de todo o país, mas a imensa maioria vinha do Nordeste, sobretudo do Ceará.

Um desses aventureiros chamava-se José Plácido de Castro, era gaúcho de São Gabriel, filho do capitão Prudente da Fonseca Castro, veterano das campanhas do Uruguai e do Paraguai, e de Dona Zeferina de Oliveira Castro.

Plácido começou a trabalhar aos 12 anos – quando perdeu o pai – para sustentar a mãe e os seis irmãos. Aos 16 anos, ingressou na vida militar, chegando a 2° sargento, entrou na Escola Militar do Rio Grande do Sul e depois lutou na Revolução Federalista ao lado dos “maragatos”, chegando ao posto de Major.

Com a derrota para os “pica-paus”, que defendiam o governo Floriano Peixoto, Plácido decidiu abandonar a carreira militar e recusou a anistia oferecida aos envolvidos na Revolução.

Mudou-se para o Rio de Janeiro, foi inspetor de alunos do Colégio Militar, depois empregou-se como fiscal nas docas do porto de Santos, em São Paulo e, voltando ao Rio, obteve o título de agrimensor. Inquieto e à procura de desafios, viajou para o Acre em 1899, para tentar a sorte como agrimensor, e logo arranjou trabalho por lá.

Na época, já havia a disputa de terras com a Bolívia, os colonos brasileiros tinham até declarado duas vezes a independência do Acre, mas o governo brasileiro mandava tropas para devolver o território. Até que surgiu a notícia de que a Bolívia havia arrendado o Acre aos Estados Unidos, através do Bolivian Syndicate, uma associação anglo-americana sediada em Nova York e presidida pelo filho do então presidente dos EUA, William McKinley.

O acordo autorizava o Bolivian Syndicate a usar força militar como garantia de seus direitos na região, onde as leis seriam impostam por juízes norte-americanos, a língua oficial seria o inglês e os Estados Unidos se comprometiam a fornecer todo o armamento que necessitassem. Além disso, tinham a opção preferencial de compra do território arrendado, caso viesse a ser colocado à venda, e a Bolívia também se comprometia, no caso de uma guerra, a entregar a região aos Estados Unidos.

Plácido de Castro estava demarcando o seringal Victoria, em 1902, quando ficou sabendo do acordo pelos jornais e viu nisto uma ameaça à integridade do Brasil. Tinha 27 anos, era o único militar de carreira que morava naquela região e decidiu liderar uma resistência. Convocou os comerciantes, seringalistas e emigrantes brasileiros, formou um pequeno grupo de guerrilheiros e aproveitou o dia 6 de agosto, feriado nacional na Bolívia, para iniciar a revolução.

Quando Plácido chegou com cerca de 60 guerrilheiros ao pequeno quartel do Exército boliviano na vila de Rio Branco, às margens do Rio Acre, o oficial boliviano julgou que os brasileiros vinham comemorar o feriado. “Es temprano para la fiesta” (É cedo para a festa), disse ele, e Castro respondeu: “Non es fiesta, es revolución”. E a guerra começou, para desespero do governo brasileiro, que não se interessava pelo Acre.

A Bolívia logo enviou mais um contingente de 400 homens, comandados pelo coronel Rosendo Rojas. Mas Plácido de Castro, precursor da guerrilha na selva, se revelou um grande estrategista e conseguiu enfrentar e derrotar o Exército e a Marinha da Bolívia em seguidos enfrentamentos.

Os combates da Revolução Acreana duraram vários meses e a revolução só acabou em janeiro de 1903, com a assinatura do Tratado de Petrópolis, pelo qual o Brasil comprou o território do Acre à Bolívia, anexando essas terras ao nosso país.

Com o fim do conflito, o Brasil seguiu dominando o comércio mundial da borracha, e a revolução liderada por Plácido de Castro sepultou o sonho anglo-americano de dominar o Acre e a Amazônia. Ao vencer o Exército e a Marinha da Bolívia, aqueles valorosos guerrilheiros brasileiros na verdade estavam derrotando também a maior potência militar do mundo, a Inglaterra, e seu principal aliado, os Estados Unidos.

Esta é uma história linda, que infelizmente não se aprende nos colégios brasileiros. O major Plácido de Castro merecia ser lembrado e homenageado como um dos maiores heróis da História do Brasil, ao lado dos almirantes Tamandaré e Barroso, do duque de Caxias e do marechal Rondon, que é precursor da força armada do futuro, aquela que, ao enfrentar um adversário mais fraco, apenas o domina, ao invés de aniquilá-lo. Sua ordem aos comandados (“Matar, jamais; morrer, se for preciso…”) há de constar na História da Humanidade.

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