As demonstrações diárias de irresponsabilidade acintosa vão ganhando perigosos ares de desequilíbrio comportamental que, em vez de aumentar suas chances de concorrer à reeleição, vão lhe retirando essa possibilidade, reduzindo seu apoio a um grupo de fanáticos.
A mais recente pesquisa DataFolha mostra que 17% dos eleitores que votaram em Bolsonaro no segundo turno estão arrependidos, o que quer dizer que cerca de 10 milhões de pessoas o abandonaram, fazendo com que tivesse hoje, teoricamente, menos votos do que obteve no primeiro turno.
Não quer dizer, porém, que todos os que não se declararam arrependidos estejam contentes com o governo Bolsonaro. Muitos, certamente, não se arrependeram porque consideram que o principal papel de seu voto foi derrotar o PT.
Pesquisas de opinião pública mostram que Bolsonaro mantém um apoio em torno de 30% da população, o mesmo índice que o PT costumava ter antes de chegar ao poder, igual ao percentual de votos que o candidato petista Fernando Haddad obteve no primeiro turno.
Não há indicações de que o PT tenha mantido seu nível de apoio de lá para cá, e o desgaste de Bolsonaro é nítido. Por isso a polarização contra o PT é bom, teoricamente, para os dois, mas especialmente para Bolsonaro se ele já não tivesse provado que não é apenas um antipetista, mas um desequilibrado, técnica e emocionalmente incapaz de enfrentar crises como a que atravessamos, e moralmente corrupto.
Não acredito que o PT tenha, nesses anos recentes, recuperado a imagem de honestidade e credibilidade que conseguiu introjetar no eleitorado, e acho, portanto, que uma repetição da polarização dificilmente acontecerá. Os extremos já se mostraram incapazes de dar uma solução para o país.
O desgaste de Bolsonaro só se acentuará nos próximos anos, já que ele é incapaz de ser outra pessoa. Já era assim antes da campanha, mas era o que tinham os que queriam alijar o PT. O centro político foi incapaz de apresentar uma alternativa ao eleitor de centro-direita que demonstrasse viabilidade eleitoral, diante da radicalização que tomou conta da eleição.
Abre-se um caminho largo até 2022 para candidatos de centro se firmarem no cenário político nacional, e os governadores, que são protagonistas dessa guerra contra a Covid-19, podem colher resultados positivos, como já demonstram as pesquisas de opinião e as redes sociais. Por isso, a cada vez que surge um político que se destaque, passa a ser potencial candidato a presidente: é assim com Mandetta, é assim com Moro.
O comportamento do presidente Bolsonaro, ao sair às ruas em Brasília, é acintoso, atitude que não pode ser vista como normal. Por causa desse comportamento, nossa política de isolamento social está começando a afrouxar, a ser rompida por grupos incentivados pelo presidente.
Não é assim que a economia vai melhorar, e esse afrouxamento provocará mais mortes, mais sofrimento. Não é à toa que a embaixada alemã está recomendando a seus cidadãos que regressem ao seu país.
Bolsonaro será responsabilizado pessoalmente pelo aumento das mortes. Não é possível ter um presidente que estimula a população a se arriscar numa pandemia, como um líder místico levando seus seguidores para o suicídio coletivo. Bolsonaro, nosso Jim Jones tupiniquim, será o PT da próxima eleição, aquele a quem será preciso afastar do poder.
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