O presidente, acima de tudo, fez uma aposta de antemão perdida por opor ciência à política e desconhecer que o medo da morte é mais forte que especulações leigas.
A derrota da tese do “vamos para a rua” é pessoal, dado que a pesquisa indica apoio ao ministro da Saúde, Luís Henrique Mandetta, aos governos estaduais e ao Legislativo, alvos preferenciais de Bolsonaro por sustentarem o isolamento social radical – a chamada quarentena horizontal. Todos cresceram na crise, inclusive parte do governo. Só o presidente diminuiu.
Os números autorizam a previsão de que o chamado “orçamento de guerra”, em fase conclusiva no Congresso, é a antessala de um ciclo de gestão pactuada do país, com perda de poder pelo Executivo. A letargia que parece ter dominado a equipe econômica, há dois meses patinando na crise, abriu o vácuo para a ação do Legislativo.
Hoje, são 28% os que dizem considerar que o presidente tem atuação boa ou ótima, contra 42% que atribuem avaliação ruim ou péssima – os números são o menor e o maior da série histórica, respectivamente. Luiz Mandetta e o Ministério da Saúde têm 68% de avaliação positiva. Paulo Guedes e o Ministério da Economia, têm 37% positiva e 18% negativa.
A mudança coincide com uma melhora na imagem do Congresso e de governadores. O Legislativo passou a ser visto como ótimo ou bom por 18% da população, contra 13% na pesquisa anterior. A avaliação negativa caiu de 44% para 32%. Em relação aos governadores, o ótimo/bom passou de 26% para 44%.
Como outro índice da pesquisa mostra que 60% acham que a quarentena deve durar apenas mais um mês, essas avaliações tendem a ser definitivas, ou seja, a perspectiva do fim da crise não apagará os desempenhos considerados negativos.
O roteiro do resgate da economia traçado pelo ministro Paulo Guedes não vale mais para o atual mandato. A economia de guerra se estenderá por mais tempo após o fim da quarentena até que a normalidade inclua a retomada do espaço para uma gestão liberal.
É nesse contexto que o presidente reage com o anúncio da demissão futura do ministro da Saúde, algo inédito no país. Um aviso prévio baseado na administração correta da crise, pelo menos na visão mundial.
Bolsonaro diz, alto e bom som, que Mandetta é indemissível hoje, mas não amanhã, por ser essencial no enfrentamento da crise. Passada esta, lhe aplicará uma demissão corretiva para aprender a humildade.
Ao confundir subordinação com submissão, o presidente exibe sua dificuldade em reconhecer outra autoridade – ainda que científica -, senão a sua própria.
João Bosco Rabello, ex-assessor especial de comunicação nos ministérios da Defesa e da Segurança Pública
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