terça-feira, 5 de novembro de 2019

A galinha do vizinho

Dia desses, participando de uma reunião, fui brindado com a seguinte frase: “Amanhã vamos criar um workgroup para estartar a análise do case e providenciar um feedback asap”.

Confesso que fiquei a pensar, naquele momento, no que aconteceria se em alguma reunião lá nos Estados Unidos um dos participantes dissesse: “Tomorrow we will create a grupo de trabalho to começar the analysis of the caso and arrange a retorno no menor lapso de tempo possível” – seria, no mínimo, caso de demissão, e talvez até mesmo de internação.

Saindo dali, ao voltar para casa, passei em frente a um dos “Business Center Plaza Bureau Convention Building & Office Tower” da vida. É curioso. Nunca tive a oportunidade de encontrar, seja na Europa ou nos EUA, uma série de edifícios com nomes brasileiros.


Há também os “Medical Health Center Diagnostic Image & Scan” – aliás, sobre estes, há algum tempo um médico amigo me dizia da dificuldade em ensinar o endereço de seu consultório para pacientes que não falam inglês. Também aqui, nunca ouvi falar de algum país de língua inglesa que nos preste tal homenagem em seus prédios.

Quer tirar férias? Vá a algum “Resort Inn Relax Flat Suites Hotels & Room Living Residence Service” – mas cuidado ao passar o endereço para o motorista de táxi, pois pode ser que ele não fale inglês e acabe perdido. Uma vez mais, desconheço onde quadro similar seja visto no exterior.

É este o ponto que gostaria de abordar: o da reciprocidade. O do amor-próprio. O do respeito pela cultura de todo um povo. O do provincianismo que amesquinha. O do sentimento de brasilidade, enfim.

Desde logo advirto: não prego o isolamento, e muito pelo contrário. Temos que nos integrar ao mundo. Devemos, sim, estudar outros idiomas, conhecer outras culturas e procurar assimilar o que elas tiverem de bom. Tudo isto é saudável, e fique bem claro tal aspecto.

Só não compreendo por qual motivo temos nos “desnacionalizado” sob praticamente todos os aspectos. O primeiro deles, já o mencionei – temos abandonado nosso próprio idioma para prestigiar o de outros povos.

Vai um segundo: abrimos mão do tratamento respeitoso que herdamos dos portugueses para os modos, muitas vezes rudes, que nos chegam pelas mãos da cultura anglo-saxônica. Enquanto isso, confesso não ter encontrado ainda um país que esteja abrindo mão de suas tradições para ficar com as brasileiras.

Segue um terceiro: empresas estrangeiras aqui desembarcam recebidas de braços abertos, adquirindo instrumentos de geração de riqueza de forma quase que maciça: nos últimos anos, 60% das empresas brasileiras negociadas foram parar das mãos de estrangeiros. Nós, que falamos tanto em agronegócio como a salvação do futuro do Brasil, já exportamos 70% de nossa soja pelas mãos de empresas estrangeiras aqui instaladas – e 30% do café que produzimos.

Desconheço, porém, em qual país empresas brasileiras tenham tal envergadura, indo da energia aos transportes, e das telecomunicações à atividade industrial estruturante. A dura verdade é que ao longo das últimas décadas temos sacrificado os empresários brasileiros em prol dos estrangeiros, sem que exista o menor sinal de reciprocidade por parte deles – e muito pelo contrário, que o digam nossos compatriotas rotineiramente discriminados no exterior.

Mas nada disso importa! Afinal, ‘nóis é the country do futuro, celeiro da mankind, um Brazil emergente, um people very smart e consciente, e com nóis nobody pode’.

Pedro Valls Feu Rosa

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