quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Tortura não é besteira

Como em tantas outras ocasiões, na terça Bolsonaro encerrou uma entrevista por não ter gostado de uma pergunta que lhe foi feita. "Parem de perguntar besteira", disse.

O comportamento em si, pela reiteração, já não surpreende ninguém, mas desta vez algo chamou a atenção. A "besteira" a que ele se referia era um documento do Ministério Público Federal sobre denúncias de tortura em presídios do Pará.

Baseado em fotos e vídeos, além de depoimentos de ex-detentos, parentes dos presos, funcionários do sistema carcerário e representantes da Ordem dos Advogados do Brasil, o relatório se alonga por 158 páginas.

Aponta práticas como empalamento com cabo de espingarda, perfuração dos pés com pregos, espancamento, uso reiterado de balas de borracha ou spray de pimenta e disparos de arma de fogo. Na ala feminina, mulheres nuas ou em peças íntimas teriam sido obrigadas a se sentarem sobre um formigueiro.

Besteira?


Os agentes acusados integram a força-tarefa enviada pelo governo federal no fim de julho para controlar rebeliões nas penitenciárias. Respondem ao Ministério da Justiça, sob comando de Sergio Moro. Confrontado com a denúncia, o ex-juiz não se saiu melhor que o presidente.

Sem nenhuma base, questionou a veracidade das informações apresentadas pelo MPF e afirmou que a "intervenção levou disciplina para dentro dos presídios".

Detonar o mensageiro tem sido uma constante entre bolsonaristas. Os jornalistas sabem muito bem disso, pois sofrem ataques sempre que publicam notícias desfavoráveis ao governo. O próprio presidente lidera o movimento, talvez confundindo o papel da mídia independente com o de uma assessoria de comunicação.

Reclamar da imprensa, no entanto, faz parte do jogo democrático. O que extrapola limites é tentar calar jornalistas, procurar sufocar os veículos para os quais trabalham, chamar tortura de "besteira" ou defender sevícias como método de disciplina.

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