O PIB do primeiro semestre pode ser negativo. E os indicadores para o segundo não são melhores. O ministro Paulo Guedes falou que é preciso paciência e voltou a culpar o passado pela estagnação do país. E pediu, nas suas palavras, “um ano ou dois” para que as reformas sejam implementadas e o país deslanche. É muito, ministro. Um ano ou dois pode ser um prazo razoável na economia, mas é uma eternidade na política. Em um ano haverá novas eleições, e em dois, o governo Bolsonaro estará entrando na sua fase final. Na fase do café frio.
A Argentina é exemplo de como as coisas podem desandar na política. O presidente Mauricio Macri vai sendo varrido pelo que Bolsonaro chama de “esquerdalha” simplesmente porque não cumpriu o que os argentinos esperavam dele e o que ele havia prometido para os argentinos. Ele não consertou a economia no prazo estabelecido pelo calendário eleitoral. No nosso caso, além de ver a economia patinando, o brasileiro já está cheio da retórica beligerante e falsa do seu presidente.
A mesma Cristina Kirchner que entregou um país em frangalhos a Macri deve voltar agora compondo uma chapa onde é a vice. No Brasil, se o efeito Orloff (“Eu sou você amanhã”) voltar a funcionar, perdurando este quadro de turbulência verbal, desconfiança geral e ineficiência administrativa, o PT, que também dilacerou a economia no maior escândalo de corrupção da história do país, pode muito bem surpreender. Num quadro desses, Fernando Haddad ganharia fácil. Até Dilma Rousseff, veja só você, poderia virar assombração.
E a economia não anda, como explicou Míriam Leitão ontem, porque oportunidades para capitalizar boas medidas são afogadas pelas crises criadas pelo presidente na porta do Alvorada. Com isso, ele corrói confianças, e as expectativas positivas dão lugar à estupefação, que gera o imobilismo. Há um outro problema que Bolsonaro não enxerga. Falta-lhe o pragmatismo que sobra em seu herói Donald Trump. Trump, que também produz crises com seu blá-blá-blá incontrolável, adiou o aumento de tarifas sobre produtos eletrônicos chineses para evitar aumento de preços aos consumidores (eleitores) no Natal. Ano que vem tem eleição nos Estados Unidos. Aí, sim, vai ser a hora de bater na China.
O compromisso de mudar a “velha política” também virou fumaça quando o governo Bolsonaro bateu recorde de liberação de emendas parlamentares na véspera da votação da reforma da Previdência e quando o presidente indicou seu filho para a embaixada nos Estados Unidos. Na segurança, outro ponto forte da retórica presidencial, não se vê novidade. Ontem, no Rio, no enterro de um dos seis jovens mortos a tiros em diversos pontos da cidade, amigos e familiares levantaram faixa cobrando solução: “Presidente Bolsonaro, até quando vidas inocentes serão tiradas?”. Os familiares do menino Dyogo Xavier culpavam a polícia por sua morte, mas quem levou a bronca foi Bolsonaro.
De qualquer forma, claro que o articulista pode estar errado. Mas não custa lembrar lembrar que o efeito catalisador criado pelo mecanismo de conhecimento do eleitor concebido pela Cambridge Analytica hoje é de domínio público, significa que a oposição também pode usar, e os controles sobre os perfis dos usuários de redes sociais são bem mais rígidos. As pesquisas mostram crescimento constante da desaprovação do governo Bolsonaro, mas pesquisas muitas vezes erram. Saberemos mesmo como navega a nau bolsonarista no ano que vem, nas eleições municipais. E o tempo voa.
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