“Ainda que os funcionários limpem as salas todas as manhãs, quem estuda no período da tarde logo volta a sentir a fuligem se acumulando nas carteiras e cadeiras”, disse Maria (nome fictício), uma moradora de Piquiá de Baixo que frequentou a escola primária até a quarta série.
Piquiá de Baixo é um povoado de cerca de 300 famílias, localizado em uma área rural do estado do Maranhão. Na década de 1980, um complexo industrial siderúrgico foi construído bem ao lado da comunidade, com algumas usinas situadas a apenas 50 metros das residências. A comunidade fica às margens da ferrovia que liga a mina de Carajás, no Pará, ao Porto de São Luís, no Maranhão. Os trens com minério de ferro, em direção ao porto, param em Piquiá de Baixo para que as indústrias transformem o minério em ferro gusa.
O que acontece em Piquiá de Baixo importa para todo o Brasil. Grandes projetos de desenvolvimento trouxeram poluição ambiental a diversas comunidades pelo país — como a de Santa Cruz, no Rio deJaneiro, e da Ilha de Maré, na Bahia. Outros grupos estão mapeando cerca de cem focos de poluição no país.
As autoridades ambientais do Maranhão não monitoram com frequência a qualidade do ar, do solo e da água em Piquiá de Baixo. Mas jovens da comunidade vêm medindo, desde 2016, a qualidade do ar da região com o auxílio de pequenos dispositivos portáteis. Os resultados, publicados no mês passado, estavam acima da concentração média anual recomendada pela Organização Mundial da Saúde e, em vários dias, ultrapassavam o limite diário recomendado.
No entanto, as autoridades não respondem aos resultados com a urgência necessária. Desde 2008, a Associação de Moradores de Piquiá de Baixo luta pelo reassentamento da comunidade.
Em maio de 2016, o governo federal assinou um contrato com a associação de moradores para o financiamento parcial da construção da nova comunidade sob o programa habitacional Minha Casa Minha Vida. Mas o processo de reassentamento continua parado dentro do Ministério das Cidades, à espera da aprovação formal dos projetos. Especialistas em direitos humanos da ONU escreveram para o governo federal em 2015 perguntando quando o reassentamento vai ser realizado, mas não receberam nenhuma resposta até o momento.
“A cada dia que ficamos aqui estamos expostos à mesma poluição”, disse Maria. “Essa é uma comunidade periférica, e as autoridades se esqueceram de nós”. É hora, portanto, de acabar com o atraso. Justiça tardia é justiça negada, e já passou da hora de reassentar a comunidade.
Richard Pearshouse
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