Às vésperas da votação da denúncia que deseja ver enterrada no plenário da Câmara, Temer cedeu às pressões dos parlamentares para modificar a medida provisória que instituiu a mais recente versão do Refis, como são chamados os programas de refinanciamento de dívidas com o fisco. A contragosto da equipe econômica do governo, o novo texto oferecerá condições açucaradas aos sonegadores: descontos de até 90% nos juros, 70% nas multas e 25% nos encargos financeiros.
A perspectiva de arrecadação despencou na proporção direta das benesses que Cardoso Júnior ofereceu a si mesmo a aos demais sonegadores da República. Se a proposta do deputado prevalecesse, a previsão de receita seria de R$ 500 milhões, não de R$ 13 bilhões. O governo levou o pé à porta. Reeditou a MP. Muitos devedores agarraram-se à versão original e compareceram aos guichês do fisco para acertar suas dívidas.
O Ministério da Fazenda faz mistério sobre o montante arrecadado. Estima-se que entraram nos cofres do Tesouro algo como R$ 9 bilhões. As adesões ao programa podem ocorrer até a próxima sexta-feira (29). E o prazo de validade da MP do Refis vence no dia 11 de outubro. A equipe de Henrique Meirelles passou a considerar que não votar a medida no Congresso seria um fabuloso negócio, pois os acertos já firmados com devedores seriam mantidos.
Eis que sobreveio a nova denúncia em que a Procuradoria acusa Temer de organização criminosa e obstrução da Justiça. Aproveitando-se do fato de que passaram da condição de apoiadores para a de donos de Temer, os governistas atropelaram a equipe da Fazenda. O acerto foi costurado em reunião com os líderes do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e no Congresso, André Moura (PSC-SE). A dupla esteve no Planalto na noite passada.
Participaram da articulação os ministros palacianos Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência). Ambos têm interesse direto em adular os congressistas, pois foram incluídos na denúncia contra Temer como membros da “organização criminisa” do PMDB da Câmara. Pelo Ministério da Fazenda, testemunhou a rendição o secretário-executivo Eduardo Guardia.
Agora, os parlamentares correm para votar o Bolsa Sonegador antes de sexta-feira. Não faltam interessados. Há na Câmara 291 deputados pendurados na Receita Federal. Juntos, devem R$ 1 bilhão. No Senado, há 46 devedores. O espeto tributário dos senadores soma cerca de R$ 2 bilhões. Tudo isso sem mencionar os casos de parlamentares cujas campanhas foram financiadas por grandes sonegadores.
Lançado em sucessivas versões, o Refis tornou-se nos últimos 15 anos uma iniciativa injusta e burra. É injusta porque cria dois tipos de guichês na Receita. Num, quem deve paga suas dívidas. Noutro, quem sonega é premiado com descontos camaradas. A mágica é burra porque estimula bons pagadores a brincar de esconde-esconde com o fisco, só para entrar na fila do próximo Refis.
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