Não há dúvida quanto à necessidade de o país substituir o atual modelo político - falido, sustentado por financiamento não raro ilícito. Mas não há qualquer chance de que ele seja alterado por aqueles que dele se beneficiam.
Se for, será sempre para pior.
E é nessa trilha do para lá de ruim ao péssimo que caminha o debate desde a delação coletiva dos executivos da Odebrecht, quando a Câmara tentou, sem sucesso, aprovar a primeira anistia a financiamentos espúrios passados. Piorou depois de a Segunda Turma do Supremo entender que o caixa oficial de campanha pode embutir lavanderia de dinheiro sujo, e chegou ao alerta máximo com a segunda lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, citando mais de uma centena de políticos, entre comandantes e tripulantes.
Além da anistia ao caixa dois, que não saiu da mira, o que se tenta agora é aprovar o voto em lista fechada, já com validade para 2018. Trata-se de um molde sob medida para proteger denunciados: eles estarão elencados em um rol elaborado pelo partido – e até com preferência para quem já é parlamentar –, algo já declarado inconstitucional pelo STF. E o eleitor, em vez de votar no candidato, vota na lista inteira, dando a vitória, pela ordem, aos primeiros relacionados pela agremiação.
A ideia foi rechaçada há dois anos, quando a Câmara também descartou o Distritão, que substituiria o atual sistema proporcional pela regra majoritária de se eleger o parlamentar com mais votos, independentemente do partido, e o voto distrital misto, que combina eleição proporcional e majoritária, com um candidato por partido em cada distrito. Manteve-se exatamente o que hoje existe, sem tirar nem por.
Em novembro de 2016, o Senado também aprovou reformas. Estabeleceu a cláusula de barreira, criando percentuais de votação mínima para que uma sigla tenha acesso ao fundo partidário e à propaganda eleitoral (dita) gratuita, e o fim das coligações proporcionais. Medidas fundamentais para banir as legendas de aluguel, detentoras de segundos milionários de horário eleitoral, e os eleitos quase sem votos, que chegam ao Parlamento na cola das grandes legendas.
Não virou lei porque ambos os dispositivos ainda dependem de aprovação de dois terços da Câmara, em duas votações. E nada indica que serão apreciados.
Mas os mesmos que nada querem mudar – se pudessem manteriam os sistemas de financiamento empresarial e, por que não, até o caixa dois, imortalizado como “recursos não contabilizados” pelo tesoureiro do PT, Delúbio Soares – agora clamam pela reforma política.
Nada diferente do que o PT e a presidente deposta Dilma Rousseff fizeram em 2013. Quando as ruas ocupadas por milhares os ameaçaram, eles sacaram do bolso a urgência popular por reforma política e plebiscito para aprová-la, como se fosse essa a reinvindicação das multidões.
Tanto lá como agora, uma armadilha tão bem tramada que enreda até gente acima de qualquer suspeita. Na sexta-feira, durante entrevista à CBN, a presidente do STF, Cármen Lúcia, se viu debatendo reforma política, que só fala a língua dos que têm seus mandatos atuais ou futuros ameaçados.
Mais uma vez, os que querem simplesmente tergiversar ou descaradamente fazer leis de autoproteção conseguiram recolocar em pauta a premência da reforma política. Mas, claro, longe de sua essencialidade. Não dão andamento ao que já foi aprovado no Senado e, muito menos, a temas como o fim do voto obrigatório e mecanismos de recall, capazes de destituir bandidos, traidores do voto ou ineptos.
Fosse um país sério, a reforma política há muito estaria feita. Já que não foi, seria a quarta na fila, atrás das reformas da Previdência, trabalhista e tributária, essenciais para tirar o país da crise.
Chamar de reforma política os remendos em curso é dar pano para vela de gente que saqueou e desgovernou a nau.
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