segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Desumano

De tanto ouvir, a gente já se acostumou. Os números já não parecem chocantes. Soam como ecos de realidade distante vivenciada em lugar alheio a nossa paisagem. Baixamos nossas exigências e, principalmente, expectativas.

Deixamos de enxergar as vidas que, afinal de contas, estão atrás dos números. Não mais existem tragédias. Apenas estatísticas. Negativas, sem duvida. Mas frias. Distantes. Números, apenas.


Contar mortos em centenas virou hábito. Tão frequente que a manutenção da sanidade parece exigir distancia e frieza. Buscamos o conforto da ilusão de que são apenas números. Por piores que sejam somente mais um conjunto de estatísticas em terra já arrasada por tragédias incontáveis.

Talvez seja este o maior perigo. Trocar indignação por indiferença gera conforto passageiro, efêmero. E cria ambiente desumano, onde sobreviver é simplesmente função do acaso. E viver é tarefa quase impossível.

Enquanto os preparativos para o carnaval seguem funcionando como relógio, assiste-se a degradação da capacidade do Estado de gerar os seus benefícios mais básicos. Já vai longe a lembrança do tempo em que a rua era bem publico, acessível a todos, e disponível a qualquer hora.

Nestes tempos estranhos, o Estado, que já nunca foi muito justo, falha, abandona, e somente não decepciona porque as expectativas são muito baixas e continuam caindo. Vive-se amostra do caos gerado pela interrupção do processo civilizatório.

No país onde ninguém quer seguir a regra e todos querem ser exceção, é natural que o colapso seja comandado (ou talvez capitaneado) por aqueles que, de alguma maneira, tornaram os recursos públicos em monopólio de corporações.

É o país da insegurança. Do caos total. Da meia-entrada. E de justiça alguma. Onde se segue lógica peculiar onde privilégios e exceções viram regra. E soterram toda e qualquer possibilidade de sobrevivência no curto, no médio, e no longo prazo.

Máquina de transformar impostos em desperdício; indiferença em violência; vidas em números; e tragédias em estatísticas. Onde a pele dura da realidade justifica, mas não perdoa a desumanidade. Nem desculpa comportamento desumano

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