quarta-feira, 6 de julho de 2016

Brasil vai mal, mas e a Botswana?

Cidade de Botswana, capital do "tigre" africano
Botswana é um pais interessante. Ficou independente da Inglaterra em 1966, na época era um dos países mais pobres do mundo, depende fortemente de commodities e tem cerca de 70% do território ocupado pelo deserto de Kalahari. Difícil pensar em um país assim dando certo, mas Botswana está dando certo. O PIB per capita de Botswana aumentou quase dez vezes entre 1980 e 2015, para que o leitor tenha uma ideia, de acordo com os dados do FMI (aqui), atualmente o PIB per capita de Botswana é maior que o do Brasil, em 1980 nosso PIB per capita era quase três vezes maior que o de Botswana. A figura abaixo mostra a evolução do PIB per capita do Brasil e de Botswana entre 1980 e 2015, menos do que fazer comparações o Brasil aparece nesta e nas próximas figuras para que o leitor possa ter uma referência de grandeza. Dito isso devo confessar que comparar um país exportador de commodities com o Brasil é sempre uma tentação, mas vou (tentar) resistir.

Uma característica comum entre Botswana e os países da Ásia que tiveram um excepcional desempenho econômico são as altas taxas de poupança e investimento. Tomando as médias de 1980 a 2015 nossas taxas de poupança e investimento foram respectivamente de 17,7% e 20%, em Botswana, no mesmo período, as taxas foram de 38,1% e 30,8%. Além de poupar mais e investir mais Botswana também poupa mais do que investe, na figura abaixo é possível ver que na maior parte do período a taxa de poupança fica acima da taxa de investimento. No Brasil acontece o contrário, via de regra a taxa de poupança é menor que a taxa de investimento, o que significa que além de investimos pouco temos de financiar parte de nosso investimento no resto do mundo. Não que o financiamento externo seja um problema, mas é uma característica que deve ser considerada quando analisamos o Brasil, principalmente pela turma que vive a pedir desvalorização cambial. As figuras seguintes mostram as taxas de investimento e poupança no Brasil e em Botswana.

Comparada ao Brasil a dívida pública de Botswana é baixa. Entre 1998 e 2015, dados anteriores a 1998 não estão disponíveis na base do FMI, o maior valor da dívida como proporção do PIB, alcançado em 2011, foi de 20,3%, em 2015 já havia caído para 17,8%. No mesmo período o maior valor no Brasil foi de 78,8% em 2002, depois disso começou uma trajetória de queda até chegar no mínimo de 60,4% em 2013, a partir daí a dívida voltou a subir de forma que em 2015 já alcançava 73,4% do PIB, quase mesmo valor de 2013.

Alojamento dos estudantes da universidade de Botswana
Tem mais uma característica de Botswana que diferencia o país africano do Brasil. De acordo com o ranking de liberdade econômica da Heritage Foundation (aqui) Botswana é considerada uma economia majoritariamente livre (mostly free, aqui) enquanto o Brasil é considerado uma economia majoritariamente não livre (mostly unfree, aqui). No ranking geral o Brasil está na 122º posição enquanto Botswana está na 30º posição. A figura abaixo mostra a evolução dos países no ranking de liberdade econômica, vale registrar que em 1995 as duas economias eram consideradas majoritariamente não livres. De lá para cá os dois países ficara mais livres, porém Botswana parece ter ido mais fundo nas reformas liberalizantes, de forma que hoje Botswana ganha do Brasil em todos os quesitos do índice.

Não conheço a fundo a economia e a história dos países da África, dedico mais atenção à América Latina, sendo assim não arrisco dizer quais das muitas diferenças existentes entre Brasil e Botswana podem explicar que eles tenham crescido tão mais que nós. Existem questões culturais, demográficas e econômicas que podem explicar o ocorrido, entretanto não deixa de chamar atenção que um país coberto por um deserto, exportador de commodities, mas que poupa mais do que investe, que investe mais e poupa mais que o Brasil e que tem uma economia bem mais livre que a nossa conseguiu sair de uma situação de pobreza e alcançar uma posição de renda média enquanto nós não saímos da renda média. Também vale registrar que a combinação investir muito, poupar mais ainda e dar mais liberdade econômica aparece em várias experiências de sucesso econômico. Não arrisco estabelecer uma causalidade, mas não recomendo ignorar tais fatores em uma tentativa de explicar o sucesso de Botswana.

Um comentário:

  1. Tenho nos últimos anos vagado por ruas de várias cidades do mundo, onde o americano do norte foi na frente com câmaras cibernéticas instaladas nos chifres de carros. De Francistown na Botswana, de Belogorsk nos confins da Rússia, de Sucre na Bolívia, de Calgary no Canadá a Pau d´Arco no Brasil... tenho vagado...vagado por muitas outras, vagando também na solidão aberta das estradas que as comunicam. A sensação pueril, sóbria e religiosamente extática é como que um espectro a migrar extremamente de um extremo a outro. Agora a pouco eu estava vagando pelas ruas de Tarsus na Turquia, terra do maior bandeirante do evangelho, que emprestou duplamente seu nome ao Brasil. Entre centenas de detalhes termino aludindo a um forte denunciador da transitoriedade da vida neste planeta: existem cidades que são quase todas elas uma só periferia, outras que nunca ouviram falar disto...:)

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