segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Polarização política se alastra às escolas do Brasil



Pegando carona na onda conservadora e polarizadora que tomou parte da política brasileira a partir das últimas eleições, deputados federais e estaduais e vereadores vêm propondo projetos de lei que pretendem combater o que consideram uma “doutrinação ideológica” nas escolas em temas políticos e sexuais.

Só na Câmara Federal tramitam quatro projetos atualmente. Outros foram protocolados em Assembleias de pelo menos oito Estados brasileiros, entre eles São Paulo e Paraná. Outros apareceram nas Câmaras de municípios como Joinville (SC), Curitiba e Vitória da Conquista (BA). A maior parte das iniciativas surgiu entre 2014 e 2015.


Esses projetos não têm apenas o mesmo objetivo. O texto também é praticamente o mesmo na maioria dos casos, seguindo um modelo base elaborado pelo movimento Escola sem Partido (ESP), uma organização fundada em 2004 e coordenada pelo advogado Miguel Nagib. A maioria dos textos não é explícita em acusar qual linha ideológica e partidária deve ser combatida, mas em discursos e entrevistas, seus autores deixam claro que os alvos são professores de esquerda e a discussão de temas como a homossexualidade em sala de aula.

Segundo alguns defensores, trata-se de impor um mecanismo contra uma esquerda que se apropriou das escolas para promover sua agenda e perseguir alunos que não partilham de suas convicções. Já para os críticos, os projetos afrontam à Constituição – que garante liberdade e expressão – e pretendem transformar os professores em meros “repassadores” de temas pré-estabelecidos, eliminando a possibilidade de qualquer discussão crítica e confronto de ideias.

O deputado Izalci Lucas (PSDB-DF), membro da Comissão de Educação da Câmara e autor do projeto 867/2015 – a proposta de “Escola sem Partido” que mais tem recebido destaque na Casa –, afirma que o objetivo não é colocar uma “mordaça” nos professores, mas combater a propaganda partidária de esquerda do governo nas salas.

“Existe um trabalho muito efetivo do PT nas escolas por meio de professores militantes que fazem campanha para o partido. É uma estratégia, que já foi delineada no Foro de São Paulo. É esse tipo de coisa que queremos combater”, diz à DW.

Para o professor Fernando Penna, da Universidade Federal Fluminense (UFF), membro do movimento Liberdade para Ensinar, que reúne alunos e docentes contrários aos projetos, a promoção dos textos não somente ganhou força por causa da oposição disseminada ao PT, mas também a partir da inclusão de temas como gênero e sexualidade no currículo das escolas nos últimos anos, algo que inflamou políticos conservadores.

Alguns dos projetos pelo país são promovidos por políticos evangélicos Marco Feliciano (PSC-SP) ou com histórico de atritos com movimentos LGBT, como o vereador Carlos Bolsonaro (PP-RJ), filho do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ).

O texto base do ESP copiado na maior parte dos projetos aponta que o professor deve respeitar “o direito dos pais a que seus filhos recebam a educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções“ e que ele “não constrangerá os alunos em razão de suas convicções políticas, ideológicas, morais ou religiosas”. Para Penna, esses itens têm como objetivo dificultar qualquer discussão que confronte religião e sexualidade nas salas. Alguns dos projetos que tomaram a base do ESP, no entanto, foram além, e chegam a pedir explicitamente a proibição de qualquer discussão sobre o que chamam de “ideologia de gênero”.

“Nesses projetos o professor sempre aparece como uma figura que vai corromper o aluno, e a escola é apontada um local de manipulação. Eles dizem querer combater preferências partidárias, mas estão mesmo é levando a disputa política e religiosa que tomou o país para a educação. Como um professor vai abordar, por exemplo, a história das religiões africanas, a teoria da evolução ou a homossexualidade se um aluno evangélico afirmar que estudar essas coisas vai contra as convicções da sua família?”, diz Penna.

No texto disponibilizado pelo ESP, está prevista a afixação de um cartaz nas salas explicando aos alunos que o professor não deve fazer “propaganda político-partidária” e que devem ser apresentadas diferentes visões sobre temas políticos e sociais. O anteprojeto também prevê que os alunos deverão contar com um canal de denúncias anônimas diretamente ligado às secretarias de Educação locais, que deverão encaminhar as reclamações ao Ministério Público.

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