Entre o final de julho e o começo de agosto, somaram 45 os mortos em operações policiais contra o tráfico de drogas na Bahia, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Do total, uma vítima era agente da lei. A tragédia escancara a brutalidade em que estamos imersos.
Em 2019, segundo o Observatório Global da Organização Mundial da Saúde, só dez países tinham taxas de homicídio maiores do que o Brasil. Formávamos um time da pesada com países a que não costumamos nos comparar: África do Sul, Lesoto e oito vizinhos latino-americanos —El Salvador, Honduras, Colômbia e Venezuela, além de quatro nações caribenhas.
No ano passado, a violência tirou a vida de cerca de 48 mil brasileiros. Em média, polícias foram responsáveis por 17 mortos a cada dia, informa o Anuário do Fórum Nacional de Segurança Pública. Como seria de prever, a barbárie não se distribui igualmente pela federação. Amapá, Bahia, Sergipe, Pará e Goiás lideram o rol de homicídios; somados ao Rio de Janeiro, também o do uso abusivo da força policial. Tampouco a matança atinge todos na mesma proporção: de ambos os lados do tiroteio, homens negros, jovens e pobres correm risco sempre maior.
As estatísticas ajudam a perceber o tamanho da catástrofe, mas não dão a medida do sofrimento das famílias atingidas, nem do medo dos ameaçados mais de perto, nem do sentimento difuso de insegurança dos que temem a violência letal, ainda quando é menor o risco de vir a sofrê-la. Também não medem o impacto da violência sobre a vida política democrática.
A direita há muito descobriu que a exploração do medo —diariamente cevado pela mídia sensacionalista— e a defesa da força bruta contra suspeitos rendem votos. A cada eleição cresce a "bancada da bala" na Câmara dos Deputados, assim como o número de eleitos saídos dos aparatos policiais nos estados. Para os paulistas, a defesa brandida pelo governador Tarcísio de Freitas dos desmandos cometidos pela Operação Escudo, em Guarujá, exuma os tempos de Paulo "bandido bom é bandido morto" Maluf.
Bolsonaro e seus seguidores não fizeram mais que entoar aos berros refrão bem conhecido.
Os democratas comprometidos com o social têm o desafio —e o dever moral— de recorrer às experiências bem-sucedidas de governos subnacionais e de organizações da sociedade, além dos confiáveis dados disponíveis, para implantar formas civilizadas de garantir a segurança pública.
Nos 14 anos em que governou o país, a centro-esquerda não se destacou por inovar nessa matéria. Tem agora nova oportunidade de mostrar que não estamos condenados à barbárie.
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