Qual a resposta dos senhores parlamentares a esse estado de coisas? Simples: dar a este presidente o comando das duas Casas do Congresso. A que custo? As cifras variam bastante, mas sempre na casa dos bilhões de reais, vindos do Orçamento federal já estourado e de mais sacrifício a gastos que deveriam ser prioritários.
Parece impossível de entender, e é mesmo. A política vai mostrando que não tem nenhum compromisso com as preocupações reais do Brasil, as urgências sociais, de saúde pública, econômicas e institucionais, e que viu na fragilidade de Bolsonaro a chance de lhe arrancar até a cueca na forma de fisiologismo explícito para afastar o fantasma do impeachment, a única coisa que aflige de fato o capitão.
Não importa que, para isso, os partidos implodam suas próprias estruturas e comprometam a própria estratégia para 2022. Como em 2018, as principais siglas mostram incapacidade de projetar as consequências de médio e longo prazo de suas ações, e ignoram a capacidade de Bolsonaro de manter uma base fiel, ainda que minoritária, para construir sua candidatura em cima dos erros dos adversários (além de outros expedientes conhecidos, como fake news, discurso de ódio, negação da política e, agora, rios de dinheiro público).
DEM, PSDB, PSD e MDB adiam ou comprometem em definitivo qualquer possibilidade de construírem uma frente alternativa ao bolsonarismo para 2022. Presos ao imediatismo de cargos e emendas não levam em conta nem o básico: se a economia continuar derretendo e a pandemia avançando, a popularidade de Bolsonaro vai cair ainda mais.
E é por isso, pela vida real, que se impõe, que talvez a vitória esperada do presidente nas eleições das Mesas não se configure um respiro longo ou uma melhora efetiva da governabilidade.
Todas as muitas e caras promessas feitas para angariar votos para Arthur Lira na Câmara começarão a ser cobradas no primeiro dia, com mais virulência quanto maior for o desgaste de Bolsonaro nas pesquisas.
O Orçamento em frangalhos não comporta todos os ministérios e emendas prometidos, e a gritaria não vai demorar, porque o Centrão não tem pruridos de fazer a cobrança em alto e bom som e na forma de votações.
Não será simples também a Lira fazer andar a pauta regressiva que Bolsonaro espera ver transformada em prioridade legislativa: a oposição, depois de um primeiro ano dominado pela discussão da reforma da Previdência e um segundo em que a pandemia ditou o apoio a projetos do governo, agora será ruidosa e atuante, mesmo que saia derrotada hoje.
A discussão sobre a volta do auxílio emergencial vai estressar Paulo Guedes e sua equipe. O governo reclamou muito de Rodrigo Maia, mas vai sentir falta do compromisso que ele sempre teve com o ajuste fiscal diante do comando do rei do Centrão, para quem o teto de gastos é apenas um obstáculo ao cumprimento das promessas de campanha.
E o impeachment? Os 60 pedidos que Maia deixa na gaveta deverão ficar lá como um alerta a Bolsonaro de que, se não ajoelhar no milho e entregar tudo o que prometeu, pode ser colocado na roda pelo hoje aliado.
Neste caso, aliás, não há que se esperar fidelidade: nem o presidente hesitará em culpar o Centrão pela persistência do fracasso de seu governo, nem o Centrão vai titubear se tiver de rifar o presidente caso sua popularidade afunde de vez no pântano da pandemia. É como a parábola do escorpião e do sapo, só que a diferença é que os dois companheiros de travessia têm ferrão.
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