domingo, 1 de novembro de 2020

Sacudindo o refrigerante

O presidente da República é um galhofeiro. Em visita oficial a um dos Estados mais pobres do País, em plena pandemia, o máximo que seu repertório intelectual, humano, administrativo e social permite é fazer piada homofóbica com a cor de um refrigerante.

Isso um dia depois de seu ministro do Meio Ambiente, o mesmo que já carrega na capanga dois acidentes ecológicos graves, sucessivos recordes de desmatamentos e queimadas na Amazônia e o Pantanal incinerado, ter usado um apelido de humorístico mexicano para responder a uma cobrança política feita a ele pelo presidente da Câmara por outra infantilidade parecida.

Esse estado de infantilismo governamental já vem cobrando um preço alto nos excruciantes 22 meses deste governo, mas olhar a balbúrdia comendo solta quando o que se avizinha é o precipício fiscal, tão bem descrito em artigo recente aqui no Estado por Nathan Blanche, da Tendências, é ainda mais assustador.

O ministro Paulo Guedes falou em audiência virtual ao Congresso nesta semana que passou. Tentou de novo fazer o Jogo do Contente que já lhe rendeu memes e perfis satíricos nas redes sociais com previsões tão otimistas quanto furadas.

Pediu aos deputados e senadores a votação de projetos que podem ajudar, no seu entender, a destravar a academia. O que mais repercutiu, no entanto, foram seus renovados ataques ao colega Paulo Marinho.

A insistência nessa briga com um ministro de pasta claramente menos apetrechada que a poderosa Economia, além da defesa subsequente de Bolsonaro a Marinho e episódios em que a equipe de Guedes fica falando sozinha, como o do decreto revogado de estudos para parcerias público-privadas em saúde, são reveladores da tibieza do ministro hoje.



Tanto que o mercado se preocupou mais com a briga pública entre Rodrigo Maia e Roberto Campos Neto, justamente pela pauta travada, que com de Guedes. Aturdidos com a inação do governo diante da pressão inflacionária, da dívida insustentável, do desemprego recorde, da falta de saída para a reforma tributária, da iminente implosão do teto de gastos, da falta de saída para o fim do auxílio emergencial e outras bombas econômicas, investidores, economistas, banqueiros, analistas econômicos e empresários já veem Campos Neto como um sucessor possível, com menos disposição a vender quimeras e mais sobriedade para negociar o que é preciso ser feito e nunca sai do papel.

Acontece que há algo que precede qualquer eventual mudança ministerial: o presidente. Bolsonaro não está nem aí para a emergência fiscal e econômica. Isso só o abala quando e se mexe no ponteiro de sua popularidade, algo a que ele se agarra com o afinco de quem não percebe que ela nem é tão alta e nem é duradoura.

Foi o presidente que deu ordem clara a Guedes para não criar nenhuma marola de temas espinhosos enquanto durasse a eleição, porque achou que só porque voltou a ser recebido por puxa-sacos em aeroportos iria “varrer o PT do mapa”, a única questão que sua imaginação limitada é capaz de alcançar.

Não rolou, até aqui. Aliás, nem para ele nem para o PT, num sinal de que 2020, com todos os seus flagelos concretos, pode fazer o País começar uma caminhada rumo a alguma racionalidade política.

Faltam 15 dias para o primeiro turno. Enquanto isso, a Comissão Mista de Orçamento segue paralisada por uma briga intestina na capenga base bolsonarista, o que nos deixa sem política fiscal clara para 2021, um ano que não será do pós-pandemia, o que já seria um pesadelo, mas o ano 2 da pandemia.

Guedes está com a caixa de ferramentas vazia. E Bolsonaro está mais preocupado em sacudir o Guaraná Jesus e abrir para ver se espirra na cara do País. E se possível em fazer algum gracejo nojento enquanto chacoalha.

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