quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Meia volta, volver

O resultado mais importante desta eleição municipal é que ela parece marcar o fim da polarização dos extremos políticos, caldo de cultura que levou Bolsonaro ao poder em 2018. A sensação é de que essa maneira de fazer política cansou os eleitores, que estão procurando coisas novas, não necessariamente do ponto de vista etário, mas diferente do cardápio que foi oferecido em 2018.

O fracasso do governo Bolsonaro, juntamente com a “nova política”anunciada na campanha presidencial e que acabou ancorada na velha política, mostra que o presidente fez bem ao escolher aliar-se ao Centrão para organizar sua base congressual, mas também que ele agora tem menos força na negociação com seus novos parceiros.

PP e PSD são as estrelas do Centrão, mas partidos que abandonaram o grupo para uma posição independente, como DEM e MDB, também se destacaram. O Centrão é tradicionalmente formado por partidos que se adaptam a qualquer governo, e essa maleabilidade também é uma ameaça à composição parlamentar de Bolsonaro, pois, para se posicionarem em outros caminhos, não custa. Até na esquerda os eleitores procuraram novas alternativas, a mais emblemática o PSOL, que não quer ser moderado, mas não está envolvido em corrupção, ao contrário, nasceu da revolta de alguns membros do PT com relação à corrupção, quando da confissão do marqueteiro Duda Mendonça, que admitiu ter recebido pagamento do PT em contas no exterior no mensalão.

O choro na ocasião de deputados petistas como Chico Alencar, que ontem teve uma grande votação no Rio como vereador pelo PSOL, ainda marca essa dissidência. Não é de estranhar que o PSOL continue aliado do PT, assim como o PSDB, nascido de uma dissidência dentro do MDB, ganhou vida própria, mas não impediu que os tucanos aderissem ao governo Michel Temer. Mas são bichos diferentes.




Está claro que as pessoas querem eficiência – para prefeito, essa exigência ainda é mais forte –, mas diante da tragédia que é o governo Bolsonaro, essa tendência vai contar mais na disputa presidencial em 2022 do que contou em 2018. A capacidade de gestão, o conhecimento, a experiência do candidato, passaram a contar para além da disputa ideológica.

Em São Paulo, o candidato do PSOL Guilherme Boulos, que teve uma votação importante, superando candidatos tradicionais como Marcio França ou Russomano e tornando-se o líder hegemônico da esquerda neste momento, vai procurar jogar o prefeito Bruno Covas para a direita, enquanto Covas já começou a colocá-lo como radical.

Ontem mesmo, depois do discurso de Covas na noite anterior dizendo que os paulistanos recusam o radicalismo, o governador tucano João Doria, candidato potencial do PSDB à presidência da República, disse uma frase que resume o que será a campanha nesse segundo turno: “Aqui, nós defendemos a propriedade privada, eles invadem”.

A pandemia foi fator preponderante nessa eleição. Ficou claro que governadores e prefeitos que tiveram atitudes firmes no combate ao coronavirus, à Covid -19, que adotaram desde o início o afastamento social e a obrigatoriedade de usar máscaras foram recompensados no final pela população, que entendeu que não era uma política contra, mas a favor dela.

É a antítese da pregação de Bolsonaro, que foi derrotado fortemente nessa eleição, não apenas pelos candidatos que apontou terem sido derrotados na ampla maioria dos casos, mas porque a visão dele da pandemia foi derrotada. Ele mesmo ficou irritado, recentemente comentou não entender como os políticos que fecharam tudo, quebraram a economia, estão sendo reeleitos.

Bolsonaro, num claro declínio, só recuperará sua popularidade se conseguir colocar o auxílio emergencial de novo na mão desses milhões de brasileiros que estão perdidos, sem emprego, sem perspectiva. Mas isso ele dificilmente vai conseguir, pois quebraria o país. A deputada mais votada no Brasil em 2018 foi Joyce Hasselman, que ontem foi das ultimas na eleição para a prefeitura de São Paulo. A deputada Carla Zambelli não conseguiu eleger o irmão, e apelou, insinuando fraude na eleição, seguindo os passos do próprio Bolsonaro, que ontem, aproveitando-se do problema técnico na apuração do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), voltou a insistir na inconfiabilidade de nossa urna eletrônica. Michele Bolsonaro apoiou quatro candidatos a vereador, e nenhum se elegeu. A ex-mulher de Bolsonaro, mãe dos 01,02,03, não se elegeu. Carlos Bolsonaro teve menos votos do que em 2016.

Assim como 2016 deu sinais do que poderia acontecer em 2018, agora parece que o vento deu meu volta, no sentido da direita civilizada .

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