Isto das pessoas olharem para uma lontra e verem um crocodilo, parece-me uma boa ilustração dos tempos que correm.
Também acontece o inverso: onde está um crocodilo, há quem insista em ver uma lontra. É o que se passa com o presidente Jair Bolsonaro, em relação ao número de mortes resultantes da epidemia de Covid-19. “Tem um monte de crocodilos por aí comendo gente”, alertam os especialistas. Bolsonaro encolhe os ombros flácidos e grita: “São lontras, p****! Duas ou três lontrinhas de merda! Querem f**** com minha família?!” — e nessa mesma tarde emite um decreto-lei equiparando os crocodilos a lontras. Por via das dúvidas, determina também que leões, panteras, jaguares, ursos e outros animais perigosos passem a ser considerados lontras.
— São todos lontras, p****! — Explica aos assessores, perplexos (aqueles que ainda têm a capacidade de se perplexizar). — Todos os f***** da p*** desses crocodilos do c****** são a partir de agora lontras fofinhas.
No dia seguinte um general entra a medo no gabinete do Presidente da República para relatar que as lontras fofinhas andam comendo muita gente.
— Que comendo o quê, c******! — Irrita-se sua excelência. — Elas andam comendo é o c* da senhora sua mãe.
Para acabar de vez com as fake news, o presidente Jair Bolsonaro emite então um decreto-lei, determinando que as pessoas comidas por lontras fofinhas não podem mais ser consideradas pessoas, mas peixes — afinal, lontras comem peixes.
Durante alguns dias a situação parece acalmar. Os jornais destacam a infestação de lontras em todos os estados do país, e a quantidade impressionante de peixe que as mesmas andam devorando, mas essa questão deixou de ser do domínio da política. Como o Presidente da República faz questão de explicar a um repórter particularmente perplexo:
Durante alguns dias a situação parece acalmar. Os jornais destacam a infestação de lontras em todos os estados do país, e a quantidade impressionante de peixe que as mesmas andam devorando, mas essa questão deixou de ser do domínio da política. Como o Presidente da República faz questão de explicar a um repórter particularmente perplexo:
— Lontras comem peixes, é da ordem natural dessa p**** toda: a vida! Quando os peixes começarem a comer as lontras, aí, sim, me avisa. Entretanto cala a boca, comunista de m****!
Chegará a noite, em que ao entrar nos seus aposentos para repousar das inumeráveis fadigas do poder, o Presidente da República encontrará um crocodilo estendido na sua cama, de boca aberta. Há de ser um crocodilo enorme, bem nutrido, sólido como um inselberg.
— Olha a p**** da lontra! — Dirá Jair sacando do revólver. — Morre, comunista, morre!
E pum! Pum! Pum!
Acontece que a realidade tem o couro duro e os dentes aguçados. Assim, acabará devorando o Presidente da República, com todas as suas insígnias e medalhas, os seus palavrões e a sua persistente fixação anal.
— Os comunistas andam criando lontras à prova de bala. — Dirá Bolsonaro ao desembarcar no Inferno, diante de um Satanás perplexo e visivelmente assustado. — Mas pelo menos voltei para casa. Eta, rapaz, que calorzinho bom!…
Nenhum comentário:
Postar um comentário