Desculpe, Millôr Fernandes, mas o tempo não urge, não ruge e nem sai de cima. O tempo está devagar quase parando, um bonde cheio de estações vazias, sem motorneiro e nunca chega ao fim da linha. Não são três meses, mas três décadas de clausura. Na última vez que estive numa calçada, se o tempo congelado não me turvou o cristal da menina dos olhos, comi um Diabólico no Gordon da General Osório.
Desculpe, Drummond, mas você falava no tempo disso, no tempo daquilo outro e, como é comum aos poetas sonhadores, lamentava a inexistência do tempo do nada – pois ele chegou, meu caro, e eu vou te contar o caso. É um nada atrás do outro. Decepcionante. Todo dia tem sido sempre o mesmo dia, em seguida é o dia de São Nunca e sobre o depois de amanhã ninguém sabe informar ao certo.
Em meio a esse desvario do tempo, no mesmo dia em que me enfiei nesta quarentena de datas malucas, tiraram do ar a Rádio Relógio. A locutora me assoprava o acalanto apaziguador de que o mundo ia em frente, tudo estava em seu lugar, e que depois do sol quem iluminava meu lar era a Galeria Silvestre, a galeria da luz. Onde se escondeu essa civilização tão bem organizada de segundos, minutos e horas, cada um deles em marcha perfeitamente assimilada para os corpos de todo o planeta agendarem suas existências?
Desculpe, Drummond, mas você falava no tempo disso, no tempo daquilo outro e, como é comum aos poetas sonhadores, lamentava a inexistência do tempo do nada – pois ele chegou, meu caro, e eu vou te contar o caso. É um nada atrás do outro. Decepcionante. Todo dia tem sido sempre o mesmo dia, em seguida é o dia de São Nunca e sobre o depois de amanhã ninguém sabe informar ao certo.
Em meio a esse desvario do tempo, no mesmo dia em que me enfiei nesta quarentena de datas malucas, tiraram do ar a Rádio Relógio. A locutora me assoprava o acalanto apaziguador de que o mundo ia em frente, tudo estava em seu lugar, e que depois do sol quem iluminava meu lar era a Galeria Silvestre, a galeria da luz. Onde se escondeu essa civilização tão bem organizada de segundos, minutos e horas, cada um deles em marcha perfeitamente assimilada para os corpos de todo o planeta agendarem suas existências?
Desculpe, Waldir Amaral, mas aquele “O relógio maaaarca” cheio de eco que você dava da cabine da Rádio Globo no Maracanã, uma pérola de filosofia popular avisando que a vida tem um tempo regulamentar para se esgotar – desculpe, grande mestre dos estádios, mas o grito perdeu a lógica. O relógio tem marcado sempre a mesma hora. Tem sido sempre o mesmo jogo de toques para os lados, da sala para a cozinha, tudo naquela cadência sonolenta do Ademir da Guia. Ninguém tem noção de quanto tempo falta, se haverá prorrogação para a volta ao grande jogo da existência e quais as regras. Será preciso tirar o sapato para entrar na casa delas?
Desculpe, Caetano Veloso, mas o tempo cantado em tua oração deixou de ser contínuo, e eu francamente não sei mais se serei ou terei sido, tal a confusão que o trancafiamento me acometeu à cronologia da alma. O passarinho do relógio ficou maluco. Deixou todo mundo assim também, sem corda, sem saber em que ano estamos e a quantas vamos. Ainda fumam Pullman no boteco da esquina? Entre uma tragada e outra, há lá fora nas ruas quem arremate uma piada cutucando a barriga do amigo com um brincalhão “Morou, Moraes? Se não morou, não mora mais” – e cai na gargalhada?
Será que ao fim e ao depois desse apagão geral da ordem natural do tempo, ainda haverá quem caia na gargalhada?
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