segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Encolher ou fortalecer o Estado?

O ministro Paulo Guedes, a par de declarações polêmicas – “não se assustem se alguém pedir o AI-5”-, pretende encolher o Estado para que este cuide do que é estritamente sua obrigação: educação, segurança pública, saúde. O foco é privatizar empresas estatais. O que levanta a questão: qual deve ser o escopo do Estado no governo Bolsonaro?

A tentativa de resposta começa com o ideário do ministro da Economia: a Escola de Chicago, berço do liberalismo e da diminuição da intervenção do Estado na economia. Ocorre que a índole do capitão Jair Bolsonaro e de seu entorno militar tem um DNA nacionalista, que viceja desde os tempos do “petróleo é nosso” nos anos 50. Nacionalismo que se identifica com Estado forte.

Um dos papas da ciência política, o sociólogo Alain Touraine, prega o aumento da capacidade de intervenção do Estado para atenuar desigualdades. O Estado tem sido fraco para debelar as mazelas. Por isso, o governo age no varejo e no curto prazo e o presidente se limita a fazer agrados para administrar.

Libelo candente contra os ultraliberais (o mercado é remédio para tudo), a análise do professor francês é um hino às utopias. Aqui, Estado forte tem sido sinônimo de autoritarismo, ineficiência, gigantismo etc. Como mudar o Estado corporativista dando-lhe capacidade de planejar no longo prazo, sem reformas capazes de deflagrar novos costumes? As reformas trabalhista e previdenciária não bastam. O que se espera são amplas mudanças.

O desafio se impõe: alinhar liberalismo, bem-estar social, Estado capaz de intervir se necessário (como na crise de 2008 nos EUA), institucionalização política, administração racional, mérito e não clientelismo.


Em defesa do Estado forte, fala-se da necessidade de combater interesses individuais e grupais que prevalecem sobre as políticas sociais. O governo Bolsonaro até prometeu acabar com a velha política, mas tateia na escuridão. No capítulo “encolhimento do Estado”, as coisas caminham devagar, dando a impressão de que ainda não sabe qual deve ser o tamanho do Estado. O presidente, por sua índole, gostaria de ter mais poder e menos dependência do Parlamento.

Parece combinar o ataque frontal a algumas áreas com uma estratégia paulatina, de operação por setor. A ciência política ensina que o reformador deve isolar cada questão, retirando-a da agenda antes que oponentes reúnam forças. Se tentar operar à base de blitzkrieg, deve cercar todos os lados rapidamente. Mas o governo perdeu muito tempo até agora.

Reformar o Estado não é tarefa fácil. Maquiavel lembrava que nada é mais difícil de executar, mais duvidoso de obter êxito ou mais perigoso de manejar do que iniciar uma nova ordem de coisas.

Por último, sobram questões: como aparar desigualdades com programas ultraliberais? Como atrair investimentos acenando para o fantasma dos “tempos de chumbo” vividos a partir de 64? (Cuidado, ministro Guedes). Como deixar de atender a um parlamentar dos grotões, ameaçado de desaparecer sem clientelismo? Enfim, qual Estado a democracia brasileira requer: mínimo, gigante ou adequado?

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