A reclamação nasceu de um caso em que, por não ter entendido a decisão ou não ter desejado entender, ele se enganou. Parlamentares não passarão a nomear pessoas para as agências reguladoras, e sim preparar uma lista tríplice, que será submetida ao presidente.
Arroubos contra o Congresso e contra o Judiciário têm sido frequentes nestes seis meses de governo Bolsonaro. A manifestação em seu apoio – e com o seu incentivo – que aconteceu nas ruas em 26 de maio teve em deputados e ministros do Supremo Tribunal Federal os alvos principais.
Limites legais, inerentes a uma democracia, incomodam Bolsonaro, um entusiasta da ditadura que vigorou no Brasil de 1964 a 1985. Em janeiro, ele assinou Medida Provisória transferindo da Funai (Fundação Nacional do Índio) para o Ministério da Agricultura a responsabilidade pela demarcação de terras indígenas. Em maio, a Câmara dos Deputados derrubou a decisão e devolveu a missão à Funai. Na quarta 19, o presidente editou nova medida determinando a transferência para a Agricultura. A manobra é inconstitucional, pois não é permitido reeditar MP numa mesma legislatura (a atual já decidiu sobre a questão).
“Quem demarca terra indígena sou eu, não é ministro. Quem manda sou eu nessa questão”, irritou-se ele na quinta 20. Ele estaria certo se vivêssemos sob um regime que despreza regras democráticas, como, por exemplo, o da Venezuela.
Valendo-se apenas da própria caneta, Bolsonaro facilitou a posse e o porte de armas de fogo. Juristas e parlamentares apontaram inconstitucionalidades nas decisões, pois decretos não podem alterar leis – no caso, o Estatuto do Desarmamento. Na terça 18, o Senado derrubou os decretos. A pauta agora segue para a Câmara. Mas Bolsonaro já disse que vai determinar à Polícia Federal que não dificulte o acesso às armas para quem pedir. Não aceita regras que não sejam as desejadas por ele.
O “pacote anticrime” do ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, prevê o “excludente de ilicitude”. Na prática, agentes teriam respaldo jurídico para matar durante supostos confrontos. Como o pacote não avança no Congresso e esse item dificilmente passará, Bolsonaro pretende enviar projeto de lei tratando apenas do “excludente de ilicitude”. Separando-o do pacotão, pode ficar mais fácil animar a bancada da bala e a militância belicista para pressionar deputados e senadores.
Em 10 de maio, Bolsonaro afirmou sobre os decretos das armas: “Estamos dentro do limite da lei. Se for inconstitucional, tem que deixar de existir”. A frase mostra o seu jeito de governar: desafia os limites da lei e adota a tática do “se colar, colou”.
A tática é ardilosa porque pode dar numa falsa derrota – ou seja, numa vitória, ainda que parcial. Testam-se as fronteiras inconstitucionais, o Legislativo e o Judiciário reagem (embora nem sempre), joga-se para a militância que os outros dois Poderes não ouvem o “povo” e tenta-se, na base do abafa, obter algum ganho.
Os planos de afrouxar a segurança no trânsito, impulsionar o desmatamento (tarefa do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles), desmantelar as universidades (diversão do ministro da Educação, Abraham Weintraub), reduzir terras de indígenas e quilombolas, liberar as armas... Nada disso é civilizatório e, provavelmente, não é constitucional. Mas qualquer ganho legal que se conseguir, em meio ao barulho das fake news e da truculência digital, já será útil.
E há os ganhos fora da lei. Desde a vitória de Bolsonaro em outubro de 2018, suas ideias passaram a ser aplicadas por quem se sentiu autorizado. Em novembro passado, como já se noticiou, o desmatamento na Amazônia aumentou 406%, segundo o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia. Ruralistas, grileiros, violadores de parques ecológicos, inconformados com limites de velocidade, policiais assassinos e outras categorias podem ainda não ter o respaldo da lei, mas contam com o apoio entusiasmado do presidente que ajudaram a eleger.
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