terça-feira, 7 de agosto de 2018

Crise e criatividade

F. W. Murnau
O FMI fez as contas e anunciou que a inflação na Venezuela chegará a 1 milhão por cento até o fim do ano. Significa o teto da inflação brasileira previsto para este ano, 6%, só que a cada 50 horas na vida dos venezuelanos. Outra ocasião na história em que a inflação chegou a esse nível foi entre janeiro de 1922 e dezembro de 1923, na Alemanha. O dinheiro que o governo de Weimar imprimia dia e noite chegou ao ponto de não poder comprar nada —porque era impossível contar as notas. No fim, as cédulas no valor de milhões de marcos já estavam sendo usadas para acender o fogão.

O espantoso é que, mesmo assim, a atividade artística na Alemanha não parou. O cinema, por exemplo. Naqueles dois anos, Fritz Lang lançou “Dr. Mabuse, o Jogador”, filmou “A Morte de Siegfried”, primeira parte de sua monumental saga “O Anel dos Nibelungos”, e preparou a segunda parte, “A Vingança de Cremilda”. F. W. Murnau lançou “Nosferatu” e começou o trabalho em “A Última Gargalhada”. Sem falar em Ernst Lubitsch, Robert Wiene, G. W. Pabst, E. A. Dupont e Paul Leni —todos continuaram ativos.

No teatro, Bertolt Brecht encenou “Os Tambores da Noite” e “Na Selva das Cidades”, escreveu “Baal” e tornou-se assistente de Max Reinhardt. Na música, Alban Berg e Béla Bartók seguiram compondo maravilhas, enquanto Arnold Schönberg inaugurou o dodecafonismo. Na literatura, Thomas Mann estava escrevendo “A Montanha Mágica”, que publicaria em 1924. Nas artes plásticas, Wassily Kandinsky, Oskar Kokoschka, George Grosz, Laszlo Moholy-Nagy e outros faziam uma revolução por dia.

A quem se destinavam esses filmes, peças, concertos, livros, quadros? Não sei, mas eles continuavam sendo produzidos.

A Alemanha estava saindo de uma guerra em que fora derrotada, e o mundo lhe apresentava a conta. A Venezuela, mais infeliz, está pagando as contas dos governos Chávez e Maduro.

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