terça-feira, 7 de agosto de 2018

'Bom dia, presidente Lula'

Quando foi oficializado candidato a presidente da República pelo Partido dos Trabalhadores (PT) no sábado, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva cumpria o 120° dia de prisão em uma cela isolada na superintendência da Polícia Federal (PF) em Curitiba. A detenção, após condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro na Operação Lava Jato, transformou o bairro Santa Cândida em um dos polos políticos mais importantes do Brasil. De sua cela, Lula coordena a campanha eleitoral, mesmo com a comunicação restrita.

Do lado de fora, desde o primeiro dia, militantes mantêm a "Vigília Lula Livre" para protestar contra o que chamam de prisão política. Todos os dias, cumprem o ritual de dar "bom dia", "boa tarde" e "boa noite" ao ex-presidente. Em cada turno, os apoiadores gritam a saudação 13 vezes, uma referência ao número do PT.

O ex-presidente recebe lideranças espirituais nas segundas-feiras e as outras visitas nas quintas-feiras. O ex-ministro e ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT), que foi indicado a vice de Lula neste fim de semana, tornou-se advogado de defesa do ex-presidente para poder ter livre acesso ao local.

A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, foi colocada na mesma condição na sexta-feira, véspera da convenção do partido. "Estamos aqui para dizer que é Lula e não tem plano B. Vamos levar até as últimas consequências", discursou Gleisi a um grupo de apoiadores em um terreno alugado ao lado da PF.

Ponto de apoio Marielle Franco: comida preparada em casa alugada
Apesar da obstinação da presidente do partido, já se especula sobre qual será a estratégia do PT, já que o ex-presidente, em tese, deve ser impedido de concorrer à presidência devido à Lei da Ficha Limpa. Assim que sua candidatura for registrada, no dia 15 de agosto, o Tribunal Superior Eleitoral passará a analisar o caso. O PT tem até o dia 17 de setembro para trocar de candidato.

Além de falar por meio de interlocutores, Lula escreve artigos e cartas para jornais, políticos e militantes. Até porque foi proibido pela Justiça de conceder entrevistas. Em suas mensagens, tem reafirmado ser inocente no processo, que aguarda julgamento de recurso no Supremo Tribunal Federal.

"Agora querem fazer uma eleição presidencial de cartas marcadas. Excluir um nome que está à frente na preferência do eleitorado em todas as pesquisas. Já derrubaram uma presidenta eleita. Agora querem vetar o direito do povo de escolher livremente o próximo presidente. Querem inventar uma democracia sem o povo", escreveu, em texto lido na convenção do PT pelo ator Sérgio Mamberti.

A "Vigília Lula Livre" começou com cerca de 2 mil pessoas por dia. Hoje, o número é menor e varia conforme o contexto. No dia 8 de julho, por exemplo, quando o desembargador Rogério Favreto concedeu um habeas corpus em favor de Lula – medida revertida no mesmo dia –, a quantidade de manifestantes cresceu. Atualmente, estima-se que cerca de 100 a 300 pessoas passem diariamente pelas diversas estruturas montadas.

Na última quinta-feira, o local estava animado com a presença de Chico Buarque e Martinho da Vila, dois ícones da música brasileira. Os músicos, no entanto, não falaram com a imprensa nem conversaram com os manifestantes no terreno da vigília, como costuma ocorrer. Em um vídeo divulgado pela assessoria do PT, Chico Buarque disse que o ex-presidente estava bem-humorado, muito firme e "disposto a ir até o fim, mesmo". "Ele disse que não troca a liberdade pela dignidade", completou Martinho.

O ator americano Danny Glover e o ex-presidente do Uruguai José Mujica foram algumas das personalidades que visitaram o ex-presidente. Na quinta-feira, Lula recebeu uma mensagem manuscrita do papa. Dizia: "A Luiz Inácio Lula da Silva com a minha bênção, pedindo-lhe para orar por mim, Francisco".

Além de visitas de políticos, artistas e outras personalidades públicas, a vigília recebe apoiadores das mais diversas regiões do país. Na quarta-feira, a Caravana do Semiárido Contra a Fome, com 100 pessoas, chegou a Curitiba depois de partir de Caetés (PE), cidade natal de Lula para participar do "bom dia", "boa tarde" e "boa noite" ao ex-presidente.

"Lula é um dos nossos. Ele nasceu no semiárido e conhece nossa realidade. É urgente a liberdade de Lula. E temos esperança porque, como sertanejo, a esperança é o que nos move", diz Helen Santa Rosa, 35 anos, moradora Montes Claros, no semiárido mineiro.

Os integrantes da caravana dormiram na "Casa Lula Livre", uma antiga creche cedida para os manifestantes. Fizeram as refeições no "Ponto de Apoio Marielle Franco", uma casa alugada onde é preparada a comida. Participaram de entrevistas na "Casa da Democracia", espaço dos comunicadores alternativos. Ainda puderam conhecer o "Acampamento Marisa Letícia", localizado em um terreno com barracas, tendas e até horta. Foi ali que o sindicalista Jeferson Lima de Menezes, de 39 anos, levou um tiro de raspão no pescoço de opositores às manifestações. Ele sobreviveu. Tudo é relatado na página "Vigília Lula Livre" no Facebook, com cerca de 11 mil seguidores.

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