Cartazes de um rosto com o dedo indicador sobre os lábios, tão frequentes em hospitais, deveriam ser afixados também nos palácios. E talvez até nos parlamentos, onde tantas coisas são vazadas por incorrigíveis boquirrotos nas ocasiões mais inadequadas. Eles esquecem que a arte parlamentar requer também a arte de calar.
Culturas antigas tinham deuses e deusas do silêncio. Saber a hora de falar ou de calar requeria já naqueles tempos remotos um equilíbrio muito difícil, daí a invocação a divindades para ajudar no silêncio ou na fala.
Muitos provérbios, frases famosas, ditos célebres e versos antológicos recomendam que se fale ou que se cale. Mas quem sabe a hora de calar ou de falar?
O Latim consagrou uma destas recomendações ao silêncio ainda no século V da nossa era, repercutindo um conselho que vinha de antigos gregos e romanos: Aliquando pro facundia silentium est (Às vezes, o silêncio vale pela eloquência).
Em muitas culturas, dizia-se que a palavra é de prata, e o silêncio é de ouro. Os dois metais eram imprescindíveis e significavam muito, cada qual no seu lugar, desde remotas antiguidades.
Todavia o ouro tinha o seu lugar referencial junto a quem detinha o poder e, por comparação, quanto mais poder, mais silêncio para ouvir os que falavam, com o fim de saber o que queriam. E só então falar. Procuravam assim os soberanos tomar as melhores decisões, depois de ouvir a todos.
Tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, mas especialmente nos Evangelhos de Mateus e de Lucas, lê-se, não um louvor ao silêncio ou à fala, mas uma constatação ainda mais sutil. Proferida originalmente em Aramaico, a sentença foi registrada em Grego e dali trazida por São Jerônimo para o Latim vulgar com a seguinte redação: Ex abundantia cordis os loquitur. (A boca fala do que o coração está cheio).
Eduardo Portela, da Academia Brasileira de Letras, recentemente falecido, reiterava a seus interlocutores e leitores, especialmente a seus alunos, entre os quais estava, com muita honra, o autor desta coluna: “o silêncio é aquilo que se diz naquilo que se cala”.
A sabedoria popular, também em várias línguas, memorizou a recomendação ao silêncio numa frase divertida: em boca fecha não entra mosca.
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