segunda-feira, 22 de maio de 2017

De Brasília, com amor

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Cara Pompeia,

Peço perdão pelo atraso desta carta. Foi exagerado. Mais de 2,000 anos é muito tempo. Tempo demais. Até pelos nossos padrões complacentes. Em nosso benefício, no seu caso, fomos a injustos por somente 500 anos, mais ou menos. Antes a gente não existia.

Sei que para você não deve fazer muita diferença se são 500 ou 2000 anos. Mas fugir do habito de evitar responsabilidade usando qualquer argumento é difícil para a gente. E, todos sabemos, toleramos sempre o cinismo. Coisa dos trópicos. Imagino que você compreenda.

Não há notícias que você tenha cometido crimes. Talvez seu único lapso de julgamento tenha sido casar com César. E seu único defeito seja ter sido jovem e bonita. Dizem que era pessoa muito difícil de conviver. Mas escolher o marido errado não é crime. Ser mulher de César deve ter tido lá suas recompensas.

Apesar de ser inocente, a gente sempre se cita o exemplo de sua punição injusta como exemplo positivo. Algo como exemplo a ser seguido pelas pessoas na preservação de suas próprias reputações, especialmente em se tratando de figuras públicas.

Dizemos acreditar, certamente com alguma dose de hipocrisia nos dias de hoje, que as aparências também importam, especialmente no caso de figuras públicas. Mas na hora de seguir o que dizemos, claudicamos. E toleramos os tropeços.

Nos dias de hoje, está mesmo difícil, talvez impossível, encontrar gente inocente. E a preocupação com as aparências já foi pela janela faz tempo. As virgens vestais desapareceram faz tempo. Então a gente vai levando com aquilo que tem mesmo.

Imagino que você acompanhe o que está se passando cá embaixo. Você ai de cima vê a gente melhor. Deve estar, como todos nós, desiludida. E chocada com toda essa maldade insolente.

Os trópicos vivem tempos em que a gente já sabe a essência das nossas personalidades públicas. Ninguém mais duvida das culpas. E ninguém não há quem não veja os culpados. Para ser exato, ainda tem gente que querem esconder seus bandidos do coração, mas negar os fatos é praticamente impossível. Durante muito tempo, a gente bem que tentou.

Inventamos os corruptos sem corruptores e agora tentamos explicar a existência dos corruptores sem corruptos. Meio esquizofrênico, é verdade. A impressão é que existem corruptos em por toda parte. Mas a maior parte delas parece ser no Brasil.

Está difícil creditar que as coisas vão melhorar. Vamos torcendo. Mas mesmo que não melhore, a gente deveria reparar pelo menos uma injustiça. Deveríamos pelo menos parar de mencionar sua história. E eliminar pelo menos esta hipocrisia.

Talvez a mulher de César consiga achar em seu coração algum espaço para o perdão. Peco a você que arranque destas palavras, as nossas desculpas por todas as vezes que invocamos a sua história. Você não merece.

De Brasília, com amor.

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