O mercado ilícito de drogas é a mais rentável atividade do crime organizado no mundo. O narcotráfico lucra anualmente, considerando os preços no varejo, cerca de 322 bilhões de dólares, segundo as estimativas mais recentes do UNODC, o escritório das Nações Unidas para Drogas e Crimes. Isso representa quase 1% do PIB global e um valor que supera a riqueza interna produzida em 88% dos países do mundo.
A comparação com outros mercados ilícitos torna ainda mais clara a dimensão do narcotráfico: o tráfico de armas movimentou, no mesmo período, 1 bilhão de dólares; o de pessoas, 32 bilhões de dólares. A estabilidade desse mercado, sem quedas significativas na produção ou no consumo ao longo das últimas décadas, a despeito da guerra mundial às drogas, desperta reflexões no mundo acadêmico e político sobre quais são as opções efetivas para o combate ao narcotráfico.
"Devemos impactar a estrutura do crime organizado", defendeu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, fundador da Comissão Global de Políticas sobre Drogas, em entrevista à DW Brasil. Para FHC, uma classe política "medrosa", tomada "por moralismos e preconceitos, e não por diagnósticos objetivos", trava o debate da descriminalização e da regulação do mercado da droga no Brasil.
"O braço importante para esse tipo de criminalidade é a ciranda financeira. Esse dinheiro entra de alguma maneira para a economia formal. Não é razoável imaginar que o chefe da favela num morro do Rio de Janeiro está com milhões de dólares debaixo do seu colchão. Não está. Isso é incorporado na economia por mecanismos e instrumentos já usados em outros crimes", explica Luiz Guilherme Paiva, ex-secretário nacional de política sobre drogas (Senad) do Ministério da Justiça. Operações de sucesso podem rastrear o caminho do dinheiro sujo, afirma. "Basta ver o que está acontecendo na Operação Lava Jato."
Paiva, que deixou a Senad em 2016, após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, afirma que uma força-tarefa para rastrear a ocultação de patrimônio do tráfico e a forma como esse dinheiro é lavado, aos moldes do que tem sido feito com a corrupção na Operação Lava Jato, é um exemplo que o país deveria seguir, principalmente num momento de crise da segurança pública e de visível fortalecimento das facções criminosas nos presídios.
"Continua-se cultivando a falsa percepção de que o desmantelamento de bocas de fumo é a melhor estratégia para combater o tráfico, ignorando que essa prática se incrementa e diversifica a cada dia, reorganizando-se a todo instante para perseguir compensações econômicas cada vez mais ambiciosas", alerta Paulina Duarte, diretora do Departamento de Segurança Pública da OEA (Organização dos Estados Americanos), em entrevista à DW Brasil.
Estudos recentes do UNODC corroboram a necessidade de uma força-tarefa, aos moldes da Operação Lava Jato, como propõe Paiva, para deter o poder econômico do tráfico. "Os fluxos financeiro ilícitos têm emergido nos últimos anos como um fenômeno global cuja importância não pode ser ignorada. Ao mesmo tempo, as pesquisas sobre o assunto ainda são limitadas, esparsas e baseadas em um grande número de suposições", aponta trecho de pesquisa publicada pelo UNODC e intitulada Estimativas das correntes financeiras ilegais que resultam do tráfico de drogas e outros crimes organizados transnacionais.
"Enquanto nós, como sociedade, imaginarmos que o combate ao tráfico é prender o traficante que está na esquina, ignorando o fato de que esta é uma economia trilionária, vamos continuar enxugando gelo", afirma Paiva.
Para as Nações Unidas, as estimativas existentes sobre esse comércio de drogas, ainda que imprecisas, já são suficientes para comprovar a prática de lavagem de dinheiro numa escala que merece a atenção política dos países. O crime movimenta um fluxo financeiro de aproximadamente 3,6% do PIB mundial, o equivalente a mais de 2 trilhões de dólares em 2009. O dinheiro sujo que é "lavado" equivale a 2,7% do PIB mundial, ou seja, 1,6 trilhão de dólares.
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