Nossa cordialidade também não nos faz generosos. A Charities Aid Foundation publica anualmente uma pesquisa que compara práticas de solidariedade social entre 140 países. A síntese deste trabalho é o cálculo de um “índice de generosidade” baseado em três medidas: doação de dinheiro, disposição de ajudar pessoas estranhas e tempo dedicado para trabalhos voluntários. O Brasil não está bem na foto. Na última enquete, de 2015, ficamos em 68.º lugar na classificação geral. Note-se que este ranking de generosidade guarda pequena relação com a renda per capita de cada país. Entre os dez países mais generosos há países ricos, como Estados Unidos, Austrália, Nova Zelândia, Reino Unido e Irlanda. Mas deste grupo também fazem parte Birmânia (o grande campeão, pelo segundo ano consecutivo), Sri Lanka e Indonésia. Os economistas muitas vezes fazem uso do índice de Spearman para medir a correlação ordinal entre duas séries (quanto mais próximo de 1 o valor do índice, maior a correlação). No caso entre o índice de generosidade e a renda per capita, a correlação é muito baixa, de apenas 0,267.
Não somos generosos e somos violentos. Dados do Banco Mundial indicam que o índice de homicídios no Brasil alcança 24,6 para cada 100 mil habitantes. Para um conjunto de 68 países, estamos na 64.ª posição. Mais violentos que o Brasil, apenas Colômbia, El Salvador, Guatemala e Honduras. Neste caso, há uma clara correlação com a renda. Países mais ricos tendem a ser menos violentos. A renda per capita média dos dez países menos violentos é de US$ 41,67 mil, contra apenas US$ 11,28 mil na média dos dez países com maior taxa de homicídio. A correlação ordinal entre renda e homicídio é relativamente alta: 0,67.
Mais que pesquisas e índices de correlação, as cenas de selvageria e os massacres nos presídios brasileiros estão a demonstrar que fracassamos na construção de uma sociedade justa e fraterna. O crescimento econômico não é a chave para a resolução de todos os males, mas as coisas ficam ainda mais difíceis quando empobrecemos. A recessão deve acabar em 2017, mas não está no radar a volta de altos índices de crescimento. A retomada será gradual e dolorosa. O desemprego vai ainda subir. Pelas estimativas do mercado, chegaremos a 2020 com uma renda per capita menor que a de 2010.
Uma década caminhando para trás certamente não contribuirá para enfrentarmos as mazelas de uma sociedade marcada pela violência e pela falta de solidariedade. O governo pode fazer sua parte avançando, como for possível, nas reformas econômicas. Mas, se quisermos construir uma sociedade próspera e mais solidária, teremos de deixar nossa cordialidade para trás.
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