Fiquei pensando: como aqueles apetrechos decorativos entraram na penitenciária? Certamente não foram as visitas que levaram os brindes para a cela do chefão, que atende pela alcunha assustadora de Garrote. Presumo que um caminhão da Lusitana (“O mundo gira e a Lusitana roda”) parou diante do presídio, descarregou o mobiliário e gente do próprio presídio o levou à cela do chefão. Não pode ter sido de outra forma. Um sofá não cabe no bolso.
Ao contrário dos sociólogos e antropólogos que se dizem especialistas no assunto, não tenho como opinar sobre o Plano Nacional apresentado pelo ministro da Justiça, inclusive porque não o li. Mas não vou esculhambá-lo gratuitamente; todos nós, sociedade brasileira, fomos pegos de surpresa pelos acontecimento e a montagem do Plano em tão pouco tempo foi uma exigência da própria sociedade.
Não conheço ninguém que não soubesse que o sistema penitenciário é o inferno que é – e que bandidos de alta periculosidade são irrecuperáveis. Livros e filmes estão cansados de mostrar o que acontece nas penitenciárias no Brasil e no mundo, EUA inclusive. No nosso caso, não só o sistema penitenciário é essa coisa monstruosa: infernais são também os sistemas de saúde (diariamente morre-se em filas, morre-se por falta de tratamento e exames), de educação (crianças saem da escola sem saber ler, escrever e fazer contas, tornando-se facilmente recrutáveis pelo crime organizado), de segurança (cá de fora), de transporte coletivo e, vale dizer, o sistema de convivência humana no Brasil. Ninguém caminha à noite pelas ruas das cidades brasileiras com a certeza que vai chegar incólume ao destino. E não só isso: sabe-se que centenas de pessoas são linchadas no Brasil. Fora, é claro, aqueles que matam por problemas no trânsito.
A verdade é que o Brasil é um país desatinado, desigual, miserável, violento por sua própria natureza, que precisa ser reformado profundamente em vários sentidos e direções. A ministra Carmen Lúcia está preocupada – certo, mas ela toparia liderar, com a voz da sua autoridade, uma reforma profunda no sistema judiciário brasileiro, tornando-o mais célere, mais eficiente, mais justo, menos burocrático e paquidérmico? Toparia correr o risco de enfrentar os interesses encastelados nos diversos escaninhos da justiça brasileira? O Brasil precisa ser passado a limpo, dizia Darcy Ribeiro. Precisa ser lavado com soda cáustica, acrescentou um dia o Brizola. Darcy e Brizola acreditavam na força da educação. Não sei se é o bastante.
Disso tudo, emerge um fato animador: com os massacres em Manaus e Boa Vista, o Brasil tomou consciência de si mesmo. O que vemos nos dá nojo, mas é essencial, o quanto antes, que reformemos o país, de cima a baixo, no Executivo, no Legislativo, no Judiciário e, sobretudo, no caráter do brasileiro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário