sábado, 15 de outubro de 2016

Cheran, onde as mulheres expulsaram policiais, políticos e traficantes

No México, o crime organizado está por toda a parte, até nos menores vilarejos - com exceção de uma cidadezinha no estado de Michoacán. Governada por mulheres locais, a população de Cherán defendeu sua floresta de madeireiros armados - e aproveitou para já expulsar também policiais e políticos ao mesmo tempo.

As mulheres se reuniram em segredo para bolar o plano. Elas estavam fartas dos assassinatos e sequestros que haviam se tornado rotina e tinham raiva dos homens mascarados que circulavam pela cidade extorquindo pequenos comerciantes. Além disso, durante mais de três anos, elas assistiram, indignadas, aos caminhões passando um a um carregados de madeira recém cortada de suas florestas.

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Mulheres comandam escolha do Conselho
Antigamente, os cartéis mexicanos lidavam exclusivamente com drogas, mas eles diversificaram seu modelo de negócios e, hoje, tentam dominar outros setores lucrativos - incluindo a indústria madeireira, a base da economia de Cherán.

Em 2011, os madeireiros estavam chegando perto da nascente de água da cidade. "Estávamos preocupadas", recorda Margarita Elvira Romero, uma das conspiradoras. "Se você corta as árvores, há menos água. Nossos maridos têm gado, onde eles beberiam água sem a nascente?

Um grupo de mulheres foi à floresta tentar dialogar com os homens armados. Elas foram verbalmente agredidas e perseguidas. A partir daí o plano evoluiu. Elas sabiam que era muito perigoso confrontar os madeireiros na floresta perto do manancial, então decidiram que interromperiam a passagem dos caminhões na cidade com a ajuda dos vizinhos.

No começo do dia 15 de abril de 2011, o "levantamiento de Cherán", ou levante, começou. Na estrada que leva à floresta, diante da casa de Margarita, as mulheres pararam as picapes e levaram alguns dos madeireiros como reféns.

Ao nascer do dia, quando soaram os sinos da cidade de El Cavario e rojões explodiram alertando a comunidade do perigo, a população de Cherán correu para ajudá-las. Foi tenso - alguns mais esquentados tiveram de ser contidos e convencidos pelas mulheres de não enforcar os reféns em uma árvore antiga na frente da casa de Romero.



"Todos corriam pelas ruas com suas facas nas mãos", diz Melissa Fabian, que na época tinha 13 anos. "As mulheres estavam correndo para cima e para baixo com o rosto coberto. Dava para ouvir as pessoas gritando e os sinos tocando sem parar."

A polícia municipal chegou com o prefeito e homens armados vieram libertar seus amigos reféns. Houve um confronto entre moradores, madeireiros e polícia. O conflito terminou após um jovem atirar um rojão em dois madeireiros, que ficaram feridos. E Cherán - uma pequena cidade de apenas 20 mil habitantes - iniciou sua jornada rumo à autonomia.


"Lembrar daquele dia me dá vontade de chorar", diz Margarita. "Foi como um filme de terror, mas foi a melhor coisa que poderíamos ter feito."
Margarita Elvira Romero

A polícia e os políticos locais foram rapidamente expulsos da cidade porque a população desconfiava de que eles estariam conspirando com a rede criminosa. Os partidos políticos foram - e ainda são - banidos sob a acusação de dividir a população. E cada um dos quatro bairros de Cherán elegeram representantes para compor um comitê municipal.

Em vários sentidos, Cherán - uma cidade de população indígena da tribo Purepecha - retomaram suas raízes e a maneira antiga de fazer as coisas sem depender de forasteiros. Ao mesmo tempo, pontos armados de patrulha foram instalados nas principais estradas que levam à cidade.

Hoje, cinco anos mais tarde, os pontos de patrulha ainda existem e são defendidos por membros da Ronda Comunitária, uma milícia ou força policial local composta por homens e mulheres de Cherán. Todos os veículos que passam pela localidade são parados e seus ocupantes questionados sobre sua origem e destino.

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