Sobrevivência, mesmo, só houve do ministério ─ e dos interesses financeiros da clientela que vive largamente às suas custas. Sua manutenção não teve nada a ver com cultura, e tudo a ver com verbas. Naturalmente, o dinheiro que existe ali não pode ser usado para cuidar de museus ou bibliotecas ─ as classes artísticas e intelectuais em proveito das quais o “MinC” ressuscitou consideram tais funções claramente desprezíveis. Elas não envolvem “o processo político de articulação entre Estado e cultura”, e todo o palavrório da mesma família ─ lembrar essas coisas, segundo a nossa inteligência, é ter uma “visão cultural de direita”. A visão certa, dentro do princípio pelo qual é sempre mais cômodo viver de dinheiro público do que do próprio talento, estabelece que o Ministério da Cultura deve sustentar espetáculos de teatro, música ou dança sem público, filmes sem bilheteria e livros sem leitores. Ou, tão ruim quanto isso, deve aumentar o ganho de artistas que têm audiência e poderiam levar a vida sem precisar de ajuda do governo. É precisamente onde ficamos, depois dessa curta comédia da extinção que nada extinguiu. O governo Michel Temer, depois de pensar um pouco, chegou à conclusão de que o problema simplesmente não valia o seu custo. Os milhões de beneficiários de um país sem “MinC”, preocupados em ganhar a própria subsistência a cada dia, não têm tempo para perder com o assunto. Os que ganham com a recriação desse estorvo mal enchem o estádio do Madureira E.C., mas falam sem parar, são levados a sério pela imprensa e incomodam os políticos; é mais conveniente abaixar a cabeça para eles e esperar que tudo seja esquecido daqui a quinze minutos. É o Brasilzão de sempre.
sábado, 4 de junho de 2016
Quinze minutos
O Ministério da Cultura, dado por extinto durante uns dias, reencarnado ao longo desse espaço de tempo fugaz numa “Secretaria da Cultura” (com direito a um secretário e outros adereços) e ressuscitado de repente sem nunca ter chegado realmente a morrer, está de novo apto a continuar gastando o dinheiro do leitor e de todos os demais brasileiros, como tem feito em seus 31 anos de existência, na sua única missão visível: doar dinheiro do Tesouro Nacional a artistas, intelectuais e quem mais, com uma boa conversa, se apresentar como tal. O ex-ministro se transformou em ex-secretário e agora é ministro de novo. Os artistas etc. continuarão a dizer “fora Temer”, ou “abaixo o golpe”, e a frequentar os guichês que sempre frequentaram. O Brasil continua quebrado (pelas últimas contas, parece que estão faltando 170 bilhões de reais para pagar as despesas públicas deste ano) e as misérias da cultura brasileira permanecem exatamente onde estavam antes de se fazer a mudança que não foi feita. Um observador imparcial, olhando para o episódio, poderia perguntar: “Que diabo quer dizer isso tudo?”. Quem acompanha mais de perto a vida pública do país responderia que não há realmente nada de novo nessa salada. Foi apenas mais um momento de operação normal do Estado brasileiro ─ é assim mesmo que ele funciona todos os dias, e vamos adiante porque a vida continua.
O Ministério da Cultura é, comprovadamente, uma piada. Não é a única, obviamente, nem a mais cara, dentro da coleção de alucinações que faz a máquina da administração pública deste país ser uma das mais pervertidas do mundo. Mas o governo ora em exercício teve a má ideia de mexer ali ─ ou então teve uma boa intenção vazia, dessas que se desfazem porque não têm musculatura para se transformar em fato. Governos, como é bem sabido, não valem pelo que vão fazer, e sim pelo que fazem. O resultado foi criar um problema em torno de questões que normalmente contam com atenção zero por parte do público em geral. Ele serviu apenas para deixar claro mais uma vez o embuste em estado puro que é a superior “intermediação do Estado” na cultura do Brasil. O ministério não extinto, como se sabe, não faz com um mínimo de decência a única tarefa que poderia lhe dar uma utilidade concreta: cuidar do patrimônio cultural que existe para usufruto da população. Os museus estão infestados de goteiras, excesso de poeira, mofo ou cupins ─ um dos maiores, o Museu do Ipiranga, em São Paulo, está fechado para o público até 2022. As bibliotecas não podem conservar obras preciosas. Parte das cidades históricas está em ruínas. Os funcionários recebem quase sempre salários infames ─ e por aí vamos. Como ficou combinado depois desse último debate, porém, o Ministério da Cultura foi mais uma vez considerado importantíssimo para a sobrevivência da cultura nacional.
Sobrevivência, mesmo, só houve do ministério ─ e dos interesses financeiros da clientela que vive largamente às suas custas. Sua manutenção não teve nada a ver com cultura, e tudo a ver com verbas. Naturalmente, o dinheiro que existe ali não pode ser usado para cuidar de museus ou bibliotecas ─ as classes artísticas e intelectuais em proveito das quais o “MinC” ressuscitou consideram tais funções claramente desprezíveis. Elas não envolvem “o processo político de articulação entre Estado e cultura”, e todo o palavrório da mesma família ─ lembrar essas coisas, segundo a nossa inteligência, é ter uma “visão cultural de direita”. A visão certa, dentro do princípio pelo qual é sempre mais cômodo viver de dinheiro público do que do próprio talento, estabelece que o Ministério da Cultura deve sustentar espetáculos de teatro, música ou dança sem público, filmes sem bilheteria e livros sem leitores. Ou, tão ruim quanto isso, deve aumentar o ganho de artistas que têm audiência e poderiam levar a vida sem precisar de ajuda do governo. É precisamente onde ficamos, depois dessa curta comédia da extinção que nada extinguiu. O governo Michel Temer, depois de pensar um pouco, chegou à conclusão de que o problema simplesmente não valia o seu custo. Os milhões de beneficiários de um país sem “MinC”, preocupados em ganhar a própria subsistência a cada dia, não têm tempo para perder com o assunto. Os que ganham com a recriação desse estorvo mal enchem o estádio do Madureira E.C., mas falam sem parar, são levados a sério pela imprensa e incomodam os políticos; é mais conveniente abaixar a cabeça para eles e esperar que tudo seja esquecido daqui a quinze minutos. É o Brasilzão de sempre.
Sobrevivência, mesmo, só houve do ministério ─ e dos interesses financeiros da clientela que vive largamente às suas custas. Sua manutenção não teve nada a ver com cultura, e tudo a ver com verbas. Naturalmente, o dinheiro que existe ali não pode ser usado para cuidar de museus ou bibliotecas ─ as classes artísticas e intelectuais em proveito das quais o “MinC” ressuscitou consideram tais funções claramente desprezíveis. Elas não envolvem “o processo político de articulação entre Estado e cultura”, e todo o palavrório da mesma família ─ lembrar essas coisas, segundo a nossa inteligência, é ter uma “visão cultural de direita”. A visão certa, dentro do princípio pelo qual é sempre mais cômodo viver de dinheiro público do que do próprio talento, estabelece que o Ministério da Cultura deve sustentar espetáculos de teatro, música ou dança sem público, filmes sem bilheteria e livros sem leitores. Ou, tão ruim quanto isso, deve aumentar o ganho de artistas que têm audiência e poderiam levar a vida sem precisar de ajuda do governo. É precisamente onde ficamos, depois dessa curta comédia da extinção que nada extinguiu. O governo Michel Temer, depois de pensar um pouco, chegou à conclusão de que o problema simplesmente não valia o seu custo. Os milhões de beneficiários de um país sem “MinC”, preocupados em ganhar a própria subsistência a cada dia, não têm tempo para perder com o assunto. Os que ganham com a recriação desse estorvo mal enchem o estádio do Madureira E.C., mas falam sem parar, são levados a sério pela imprensa e incomodam os políticos; é mais conveniente abaixar a cabeça para eles e esperar que tudo seja esquecido daqui a quinze minutos. É o Brasilzão de sempre.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário