Era previsível que, em algum momento, a devassa da Lava Jato chegasse ao primeiro escalão do PMDB, coadjuvante do PT ao longo dos últimos 13 anos – no governo e na rapina ao Estado.
Caricata é a euforia do PT diante das gravações, produzidas por Sérgio Machado, como se a descoberta de novos corruptos reabilitasse os anteriores – e como se os de agora não integrassem a mesma quadrilha já interditada. São companheiros de viagem.
Eduardo Cunha, Romero Jucá, Sérgio Machado, Gim Argello, Waldir Maranhão - e outros que ainda virão à tona - são acusados de crimes que, segundo o Ministério Público, tinham PT, Dilma e Lula na chefia. O Petrolão é obra conjunta, mas com claro comando: o PT. Se alguém da oposição agregou-se à quadrilha, será também arrolado.
É, portanto, surrealista a ideia de que Dilma, Lula e PT têm o que ganhar com a revelação de seus cúmplices de segundo escalão.
As gravações mostram a classe política no banheiro com a porta aberta. Lá estão os palavrões de sempre, a visão minúscula da vida pública, a ausência de norte moral – e o odor fétido de tudo isso.
Também aí, PT e PMDB se equivalem. Se alguns viam o impeachment apenas como truque para parar a Lava Jato, sintonizaram com a população pelo avesso, já que, para esta, o impeachment era – e é - medida de higiene moral.
O governo transitório é o que temos, não o que desejávamos. Se não funcionar, não se sabe o que virá, mas com certeza não será mais o PT. O país não quer andar para trás.
A Lava Jato não vai parar. É hoje mais sólida e estável – além de bem mais popular -, que o próprio governo, cujo futuro a ela se submete. Michel Temer, ao que parece, não levou isso em consideração, ao convocar para seu governo gente sob investigação ou com reiteradas citações por parte de delatores.
Romero Jucá, ex-ministro de Lula - e ex-líder do próprio Lula e de Dilma -, era um desses. O fato de ser um bom articulador político não o torna menos vulnerável, nem reduz o peso de seu prontuário. Não foi por falta de aviso que Temer não apenas o convocou como o tornou um integrante do seu assim chamado núcleo duro, cedendo-lhe uma das pastas mais estratégicas, a do Planejamento.
Foi um tiro no pé – e, ao que parece, há mais balas na agulha. O ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, por exemplo, é outro investigado. E há o novo líder do governo na Câmara, André Moura, acusado não apenas de corrupção, mas até de um crime de morte.
Será que, entre os 367 deputados que votaram pela admissibilidade do impeachment, não havia um único nome menos problemático? Sabe-se que Michel Temer formou um Ministério para garantir não apenas as primeiras medidas econômicas no Congresso, mas também a confirmação do impeachment no Senado.
Escolheu, por isso, gente que jamais caberia no rótulo de notável, como o filho do senador Jáder Barbalho, Hélder Barbalho, para seu ministério. Jáder não votou pela admissibilidade do impeachment. Com o filho na Esplanada, deve fazê-lo agora. Não é um notável; é um notório, como tantos outros.
A pergunta é: vale a pena correr tal risco? As gravações que estão sendo reveladas e as delações premiadas em curso indicam que não. Qual a relação custo-benefício de uma frouxidão ética? Não se sabe o que está por vir, mas o que já se sabe não é pouco – e sugere que os diálogos de latrina estão longe de se esgotar.
Registre-se a favor de Temer a atitude que teve com Jucá. Demitiu-o sumariamente, em contraste com Dilma, que manteve em seu círculo mais íntimo alguns réus e investigados da Lava Jato, gente como Ricardo Berzoini, José Eduardo Cardoso, Aloizio Mercadante, Edinho Silva, além de ter tentado dar abrigo a Lula, nomeando-o ministro para que escapasse de Sérgio Moro.
Pior: teve – e continua tendo – como seus porta-vozes no Senado outra falange de investigados, como Humberto Costa, Lindberg Faria, Gleise Hoffmann e Thelmário Mota (cuja mulher acaba de ser presa). Chega a ser engraçado vê-los indignados com o teor das gravações, em discursos inflamados contra a corrupção.
Dilma avisa que irá usar, em sua tentativa de reverter o impeachment, a gravação em que Jucá diz que, para parar a Lava Jato, só mudando o governo. Ainda bem que ela não usará as demais gravações, sobretudo aquela em que Renan Calheiros diz que ela é corrupta, e a outra, em que Sarney diz que, com a delação de João Santana e sua mulher, ela estará perdida.
Em suma, o país vive um momento sanitário, cuja demanda básica é não interromper o fluxo da descarga, nas mãos da Força Tarefa da Lava Jato e do juiz Sérgio Moro.
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