segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Alma coletiva de Dilma, anunciada em janeiro de 2015, encarnará em janeiro de 2016


Primeiro alguns números: a construção civil demitiu 447.728 pessoas. Temos 1,7 milhão de desempregados recentes no país. Um lote de 8,8 milhões já estavam desempregados. Fora o rebaixamento das duas agências gringas, o Brasil está sem crédito no exterior desde julho passado. O investimento direto estrangeiro deve recuar para US$ 50 bilhões, abaixo da média de US$ 73 bilhões, registrado desde 2008.

Some-se a isso que, dos 136 países listados pela agência Standard & Poors, só 19 perderam o selo de bons pagadores. Seis conseguiram voltar ao time de bons pagadores, como Colômbia e Uruguai. Nós não voltaremos tão logo.

Agora vemos nesse fim de semana, na mídia, que Dilma só vê um jeito de contornar as coisas: fazer uma guinada à esquerda, com Nelson Barbosa, na Fazenda, liberando o consumo desenfreado que as centrais sindicais (que pediam a cabeça de Levy) postulavam.

O termômetro do Peru Sadia apita quando você alia uma crise econômica, sem precedentes, a um projeto nacionalista, como tábua de salvação. Dilma vai brandir, em 2016, o evangelho do “retorno ao campo social” defendendo um novo nacionalismo.

O termômetro do Peru Sadia apita, ainda mais, quando lembramos do discurso de posse de Dilma, em janeiro de 2015.

Lembram que ela muito insistiu em falar em “alma coletiva”?

Pois bem: quem mais entendeu sobre alma coletiva no Brasil foi o embaixador José Osvaldo de Meira Penna, sobretudo em sua obra “Em Berço Esplêndido” (Editora Topbooks, 1999). Meira Penna mostra, como ninguém, que Getúlio Vargas, exatamente quando o Eixo assombrava o mundo na Segunda Guerra, vendia, a torto e a direito, a ideia de “alma coletiva”.

Meira Penna dissecou como ninguém os perigos da “alma coletiva” ser defendida no Brasil. E foi beber na origem de quem apontava os perigos na alma coletiva na política: Karl Jung.

Escrita em 1936, a obra Wotan, de Jung, deixa claro os perigos da alma coletiva em política: “A a psicose coletiva alemã surge a partir do louvor da imagem arquetípica de Wotan, deus nórdico pagão dos germânicos, das tempestades, da efervescência, da inspiração e da guerra”.

Segundo Jung, de Wotan corresponde a “uma qualidade, um caráter fundamental da alma alemã, um “fator” psíquico de natureza irracional, um ciclone que anula e varre para longe a zona calma onde reina a cultura”.

Tem muito líder religioso fundamentalista que adora também o termo alma coletiva. Mas o vende como “egrégora”.

Do grego egrêgorein, «velar, vigiar”, é a soma de energias coletivas.

Juntemos as peças: crise impagável, nos dois sentidos do termo; guinada à esquerda como resgate de identidade nacional: e alma coletiva.

Temos os ingredientes venenosos para um nacionalismo intolerante: nacionalismo milenarista.

O projeto do PT, para 2016 sob Dilma, é o de um partido que quer ver um Brasil bipolar, dividido entre o bem e o mal.

Virá um partido milenarista como nunca vimos: William Miller, capitão dos EUA, previu o fim do mundo um punhado de vezes, no final do século 19. E para cada data de fim do mundo que prefixava, Miller vendia túnicas de ascensão, sem as quais os “bons” não seriam arrebatados aos céus quando do dia do Armagedon (Miller emprestou seu sobrenome ao conceito de milenarismo).

Juntemos essa química a algo não tão distante. Foi a crise econômica da República de Weimar que criou terreno para o surgimento do pessismo cultural (kulturpessimismus) que acabou gerando o partido Nacional Socialista e o nazismo. E lembre-se: eles adoravam a alma coletiva defendida por Dilma.

A crise profunda gera também alguns substratos culturais bem malucos.

A tese de doutorado do jornalista Ignacio Ramonet, do Le Monde Diplomatique, escrita há tantos anos, diz melhor, e mais. Indica que, em épocas de crise, o cinema atrai o populacho purgando-lhe os medos reais com medos imaginários ainda mais terríveis.

Foi depois da crise da Primeira Guerra Mundial que a República de Weimar produziu o clima para Nosferatu, para Fritz Lang, e para os terrores e monstruosidades em preto e branco de Murnau. Os monstros clássicos do cinema japonês, Gargula, Monstro da Bomba H, Godzilla, vieram depois de Hiroshima e Nagasaki.

A crise do Petróleo de 73 gerou a primeira filmagem do Destino do Poseidon, Tubarão e Inferno na Torre, a partir de 1975. O medo da virada do milênio, de 2000 para 2001, nos trouxe Mar em Fúria e Independence Day. Hollywood também buscou outros panegíricos: quando a autoridade federal entra em crise nos EUA, a partir de 1973, com o caso Watergate, a indústria de cinema gringo convida as minorias a serem, nas telinhas, heróis federais: o tira grego Kojak, o tira negro Shaft, e os tiras italianos Columbo e Serpico.

Como o Brasil vai reagir?

De tudo isso, tenho medo de um fantasma só: a alma coletiva de Dilma, anunciada em janeiro de 2015 : mas que começa a operar em janeiro de 2016.

E não me venham com o papo de que minorias optam pelo coletivismo deboísta. Quem mais criticou o conceito de alma coletiva, aliás, foi o negro mais brilhante dos EUA: W.E.B. Du Bois, homem de Harvard , estudado na Alemanha. Referia que a “alma vital”, a que em alemão ele chamava de “seleleben”, ia pelo individualismo.

Sinto cheiro de pólvora no ar.

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