É verdade que nem todos pensam assim mas também é verdade que o exemplo dos outros devia ser motivador dos nossos comportamentos. Confesso que, desde pequeno, me interessam, me comovem ou me magoam os actos da espécie humana e, que me lembre, nunca tive a mínima atracção, mesmo infantil, por aqueles que pretendiam impor a sua vontade aos outros. “Nunca exerças o teu poder sobre os outros de maneira que eles fiquem sem poder sobre ti.” De certo modo, este é um dos lemas da minha posição no mundo nesta matéria tão difícil que é viver em comunidade.
Lembro-me que Lanza del Vasto me contou que, quando ainda novo, partiu para a Índia, descrente da Europa infestada pelas guerras, foi viver junto de um guru que estava sozinho na montanha. Não aguentou a falta dos outros e foi isso que o levou a partir para o pé do Gandhi, em cuja comunidade viveu durante 12 anos e a conselho de quem regressou à Europa para fundar em França uma comunidade – L’Arche – onde o conheci e acompanhei alguns dias.
A muito custo, com avanços e recuos, a humanidade parece às vezes que caminha para um mundo de paz e fraternidade mas os homens não nos deixam viver assim. Neste momento da história parece mesmo que estamos a viver um período de regressão. O sonho da expansão da democracia e da confiança mútua foi quebrado pelo pavor do terrorismo. Entrámos outra vez num destino de insegurança mas acho que não devemos desanimar: temos de admitir um recuo numa utopia que nos parece um projecto razoável mas, como disse, estamos numa regressão perante a ideia de “paz perpétua” que sentimos no fundo de nós. Talvez a paz não seja só a inexistência da guerra ou talvez a guerra não seja só o afrontamento de dois exércitos que espalham a destruição e a morte. É que a guerra começa nos comportamentos de cada um: na maneira como tratarmos os que estão ao pé de nós – maridos, mulheres, filhos, pais, empregados, patrões, em resumo, o nosso próximo.
António Alçada Baptista, Revista Máxima
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