A Samarco disse em seu site que o rejeito é “inerte”, composto em sua maior parte por sílica (areia), e que “não apresenta nenhum elemento químico que seja danoso à saúde”. OK, mas é muito pouco para um desastre desta natureza. Por que a empresa não apresenta o laudo químico completo?
A informação é fundamental para dar segurança às populações diretamente impactadas. Não à toa pessoas em Governador Valadares (MG), por onde passaram os rejeitos há 7 dias, não querem tomar a água tratada do rio. Mas não só isso. Conforme os rejeitos descem pelo rio Doce – a esta altura a mais de 700 quilômetros do local da barragem rompida – a lama vai carregando poluições outras, de forma que fica impossível estabelecer o que veio da Samarco e o que veio de outras fontes, pois há outras indústrias no caminho. “Sem o laudo químico original será impossível estabelecer, ao longo do rio, a pegada de poluição da mineradora”, me explicou Moacyr Duarte, pesquisador do Grupo de Análise de Risco Tecnológico e Ambiental (Garta) da Coppe/UFRJ.
Falei também Gergely Simon, do Greenpeace em Budapeste, na Hungria. Simon acompanhou de perto um desastre ambiental na cidade húngara de Kolontar, no ano de 2010, quando vazou o material de uma indústria de alumínio para o rio Danúbio. Mostrei a ele o resultado da análise de água encomendada pela prefeitura do Baixo Guandu (ES), quando a lama passou por lá alguns dias atrás – e que indicou alta porcentagem de ferro, arsênio e bário. Mas como a lama já havia viajado mais de 400 quilômetros até o momento da coleta, Simon fez a pergunta óbvia: “mas e o laudo químico do que continha a barragem? Sem esta informação, a análise fica comprometida, inclusive para se detalhar a extensão da responsabilidade dos envolvidos no vazamento em relação aos efeitos no percurso do rio. Sem este DNA, investigações futuras serão falhas”, alertou.
Em breve a lama inerte chegará ao Atlântico. Transformar seu conteúdo original em mistério será um acinte. Que autoridades ambientais federais e estaduais de Minas Gerais não estejam cobrando isso publicamente das empresas de forma enérgica é incompreensível (depois não se sabe de onde vem a profunda crise de representação que vivemos).
Mal comparando, é como se após um desastre de avião com vítimas fatais, a companhia aérea ignorasse a existência da caixa preta. É tragável?
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