terça-feira, 6 de outubro de 2015

O dever de falar

Certa vez, lá se vão três décadas, Jânio Quadros foi indagado sobre como ele, um homem que se dizia sem grandes posses, fazia campanha à prefeitura de SP (que acabou conquistando, em 1985, ao derrotar FHC de forma surpreendente) com tanto dinheiro. Jânio respondeu com sagacidade:

- Por favor, alguém me cede um cigarro? – começou. Choveram maços sobre sua mesa.

- Também estou sem isqueiro... – continuou o ex-presidente, apalpando os bolsos do paletó. Várias pequenas chamas iluminaram seu rosto, completando a senha para sua resposta, com o inconfundível sotaque e seu dom de iludir:

- Está explicado como consigo tantos recursos, não?

Jânio Quadros e Leonal Brizola (Foto: Arquivo)

Na outra ponta do espectro político, Leonel Brizola costumava dizer, quando indagado sobre como teria fundos para tantos projetos, como os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), que queria construir no Rio de Janeiro, “que os recursos estão na cabeça do bom administrador”.

Verdade ou não, esses e outros políticos ‘antigos’ sempre respondiam ao que lhes era indagado. Não fugiam da liça, bem ao contrário de Paulo Maluf, que ainda está em cena, e de várias ditas ‘lideranças’ políticas atuais. Investigações da Lava Jato? Assunto incômodo. Contas na Suíça? Deixa isso para lá.

O pior: quase todos os parlamentares, da quase totalidade dos partidos, também não se dispõem a ‘incomodar’ Suas Excelências, os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado. No caso de Eduardo Cunha, acusado de ser beneficiário de contas no exterior, a ‘proteção’ é edificada por razões baixas: uns se calam por considerá-lo útil ao processo de impeachment de Dilma; outros, para não melindrá-lo, evitando que, assim, ele acelere o impeachment. É também patético que não ocorra a quase ninguém que seria estranho, à luz da moralidade pública, ter um processo de cassação por supostos mal feitos coordenado por alguém que é investigado pelos Ministérios Públicos da Suíça e do Brasil por mal feitos similares aos que atingiriam o Executivo.

Diante desse “mar de cumplicidades”, expressão usada recorrentemente por Brizola, só mesmo a vassourinha de Jânio – operadas para valer, pelas mãos da indignação cidadã. Para varrer todos os que, na vida pública, preferem o silêncio quando seus aliados são flagrados.

A vida pública não comporta esse nível de degradação. Os que calam vão se encaminhando para a vala comum do lamaçal onde chafurdam quem não têm a mínima grandeza para ocupar as funções para as quais foram investidos. Logo serão cobrados pela omissão cúmplice
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