Barajas, um dos mais importantes e movimentados aeroportos da Europa, acabara de ser reformado e modernizado (a capital espanhola inteira, aliás, parecia um imenso canteiro de obras e paraíso das grandes empreiteiras). Era então o mais novo e imponente postal de entrada e saída da cidade repaginada. O mundo e o tempo loucos e maravilhosamente criativos dos anos 60/70 haviam ficado para trás nas muitas voltas. A juventude quase nem fumava ou lembrava mais dos famosos “chinos de Madri” da canção “Un Vestido y un Amor”, do portenho Fito Paes, que o baiano Caetano Veloso transformaria em sucesso mundial no disco “Fina Estampa”.
Foi no aeroporto, daquela vez, que vi a “FP-Foreign Policy” (edição espanhola) exposta em um lugar de destaque da vitrine na babel do quiosque de revistas e periódicos do mundo inteiro. Achei estranho o nome da publicação, mas o design moderno da capa e as chamadas para as matérias principais da edição que acabara de sair do forno, me apanharam de cheio.
Comprei um exemplar para ler no voo de volta ao Brasil. Abri a revista e logo fui arrebatado por uma paixão jornalística à primeira vista, da qual depois não mais me afastei ou me arrependi, apesar das novas e tantas viradas do planeta. Isso aconteceu há uma década, quando o Brasil também “era tudo de bom”, no dizer quase nunca questionado da baita propaganda oficial do Governo Lula e do PT. Nem se falava em Mensalão e, muito menos, se imaginava um escândalo de ladroagem envolvendo corruptos e corruptores - malfeitores públicos e privados em conluio - do tamanho da Lava Jato. Que a cada dia, praticamente, aponta para novos desvãos criminosos e de consequências ainda insondáveis. A conferir.
Recordo do episódio em Madri depois de ver, esta semana, a reportagem da “FP-Foreign Policy” (edição dos Estados Unidos), que traz entre seus principais conteúdos, uma reportagem demolidora a partir do título: “Lula está apoiando empresas corruptas a fazer negócios corruptos no exterior”.
Abro aqui um breve espaço de informações sobre a “FP”, para quem desconhece a revista norte-americana não ficar imaginando que a publicação de nome tão estranho é um “balcão de negócios jornalísticos”, ou algo superficial, nos moldes das revistas de escândalos em torno de “celebridades”, tão comuns na Espanha e no Brasil, ou dos famosos tabloides britânicos, para ler no metrô e jogar no lixo.
“Foreign Policy (FP)” requer muitos e quase todos favoráveis adjetivos: prestigiosa, inovadora, lúcida, substanciosa e inteligente revista dedicada a ideias globais. Trata de assuntos internacionais (do futebol da FIFA, na Suíça e Estados Unidos, ao Petrolão, no Brasil) de maneira diferente e igualmente interessante. Encara criticamente, de forma permanente e criteriosa, o desafio de alcançar em seu conteúdo, a difícil mescla jornalística de “seriedade, amenidade e rigor”. Servidos em textos primorosos
Há, porém (e sempre há um porém), os que consideram FP um reduto inexpugnável de intelectuais neoliberais , elitistas vaidosos e inimigos do “pensamento de esquerda e dos intelectuais, gente do poder e de governantes em geral que o expressam e representam”.
São opiniões. O fato é que a reportagem da “Foreign Policy” considera que o Brasil cria novo modelo de investigação da corrupção ao apurar ação do ex-presidente Lula fora do governo, o que é praticamente inédito em todo o mundo. “Enquanto muitos ex-presidentes e premiês já foram investigados após deixarem os cargos, é a ação deles enquanto governantes que normalmente é analisada. Investigações (neste caso ) estão examinando o papel que [Lula] da Silva teve para garantir contratos para a Odebrecht em Cuba, no Panamá, na Venezuela, em Gana e em outros países'', diz a revista americana em sua página na Internet.
Foreign Policy é editada em Washington desde 1970. A edição espanhola da revista, cujo exemplar adquiri em Barajas, é bem mais recente: começou em 2004. Me penitencio, pessoal e profissionalmente, pelo atraso da descoberta, apesar de ter passado antes pelos Estados Unidos, quando FP já era sucesso entre seus leitores, principalmente nos meios intelectuais e jornalísticos. Vida que segue.
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