Um ano mais novo do que Ariano e nascido no longínquo sertão do mesmo Estado da Paraíba, Francisco Pereira da Nóbrega assumiu compromisso similar com a mãe, Jardelina, e interrompeu o derramamento mútuo de sangue. Assim, rompeu a corrente da vendeta do pai, o cangaceiro Chico Pereira, assassinado pela polícia de seu Estado. Padre, filósofo, membro da Academia Paraibana de Letras, escreveu o primoroso Vingança, não! sobre a saga familiar. A crônica policial é pródiga de exemplos em que a violência da tradição tem sido substituída pelo convívio pacífico de antigos inimigos mortais.
Na vida pública, o talião também pode ser trocado por reconciliação de ex-desafetos. A Paraíba, palco dos fatos narrados, tem bons exemplos disso: em 1950, José Américo de Almeida saiu da União Democrática Nacional (UDN) e foi para o Partido Liberal (PL) para derrotar na eleição para governador o chefão de sua ex-legenda. Teve, então, o apoio do arquiadversário Partido Social Democrático (PSD). Em 1986, os inimigos João Agripino Filho e Ernani Sátiro se uniram para apoiar a indicação de Antônio Mariz, que perdeu a eleição indireta para o indicado de Zé Américo, Tarcísio Burity. Destino inglório também teve a Frente Ampla formada por Juscelino Kubistchek e João Goulart com o ex-rival Carlos Lacerda, em 1966. A iniciativa foi abortada pelos antigos aliados da ditadura militar de 1964.
Caso clássico a ser narrado ainda é o do Partido Popular (PP), fundado pelo udenista Magalhães Pinto e por seu antiquíssimo rival, o pessedista Tancredo Neves, em 1980. Mas só duraria dois anos, após reforma partidária imposta pelos sequazes da ditadura. Ou seja, são exemplos eloquentes, mas nem todos deram certo.
Ainda é cedo para determinar êxito ou fiasco da tentativa de qualificar a Frente Ampla partidária formada para atender ao clamor popular pelo fim do desgoverno nazifascistoide de Jair Messias Bolsonaro. Mas manda a prudência temer pela possibilidade de não dar certo a gestão a ser empreendida pela Frente Amplíssima necessária para dar à chapa eleita pelos Partidos dos Trabalhadores (PT) e Socialista Brasileiro (PSB). Pois há nítidos indícios de que o PT não prioriza o fortalecimento de uma aliança multipartidária e mutiideológica para reconstruir o Estado e dar continuidade ao projeto democrático contido na Constituição de 1988, implodidos pela perversa atuação da extrema direita no poder desde 2019.
O emedebista Michel Temer, duas vezes eleito pela população vicepresidente na chapa de Dilma Rousseff, foi excluído da lista de convidados para a diplomação de Lula e Alckmin. Este é o claro recado de que os petistas não desistiram da vingança do impeachment de Dilma, esquecendo que madame não teria mandatos a cumprir sem os votos do aliado da chapa. E mais: que as eleições não foram fraudadas e, portanto, ele não foi golpista, mas eleito pelo voto popular que a elegeu. Isso é grave, mas não é tudo. Pior ainda é a conformação de um governo que não promete ser de um Lula novo, mas a recuperação de um velho desastre econômico que resultou em grotesco arremedo de Pietá nos jardins do Alvorada abandonado por Jair Messias e Michelle Bolsonaro. O Dilma 2 e meio.
A outra vingança é a volta por cima da temporada do líder máximo na prisão da Polícia Federal em Curitiba. Iniciada com a colaboração do adversário favorito na farsa da transformação de multicondenado em inocente-mor, ela se concretiza na tentativa de tornar o presidente eleito uma versão sindical de Nelson Mandela. Consagrando por evidente a desnecessidade de qualquer tipo de arrependimento. Ou da garantia de que um Lula 3 não repita seu passado oculto nas trevas desse nefando acordo com o Congresso de Arhur Lira e seus nefastos orçamento secreto e PEC da Gastança, aumentos absurdos de vencimentos de maiorais de republiqueta e indulgência absoluta para a mais suprema impunidade.
Diante de tais fatos nefastos resta a esperança que a divisão do País, refletida nas votações dos candidatos a presidente, sirva de alerta contra abusos repetitivos e insuportáveis. O povo brasileiro não suporta mais farsas e avanços absurdos de assaltos ao erário, seja em arrombamentos dos cofres das viúvas, seja no aumento da dívida pública para sustentar sombra, água fresca e luxo nos palácios de ostentação de uma casta indiferente, insensível e insaciável. A história já deu várias demonstrações de que quando a situação chega a esses extremos, uma explosão pode se tornar inevitável. É melhor criar juízo e consertar.
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