segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

Uma história do futuro

Epidemias virais como a de Covid-19 dependem um pouco do acaso para começar. É preciso que a mutação certa apareça na hora e local certos. As de bactérias são mais previsíveis. Graças ao fenômeno da resistência, há, neste exato momento, bactérias trocando plasmídeos no corpo de algum paciente e assim forjando uma linhagem de patógenos capazes de debelar nossas defesas farmacológicas. Plasmídeos são moléculas "soltas" de DNA, que podem codificar resistência a agentes antimicrobianos e se transmitem mesmo entre bactérias não aparentadas.

Se uma linhagem de E. coli desenvolveu resistência à ciprofloxacina, por exemplo, pode passar essa característica a uma cepa de, digamos, S. aureus. Médicos já precisam lidar todos os dias com essas variantes resistentes. Um estudo do governo britânico estima que, em escala global, elas já causem 700 mil mortes por ano e, se nada for feito, em 2050, responderão por 10 milhões de óbitos anuais.


Há alguma incerteza em relação a esses números, mas não em relação ao movimento e suas implicações. É que o fenômeno do surgimento de resistência pode ser descrito como uma das leis da biologia. Elas não têm a mesma precisão das equações da física quântica, mas seu valor preditivo está bem estabelecido. E a resistência não vale só para antibióticos mas também para herbicidas, pesticidas e até quimioterápicos contra o câncer.

Rob Dunn, em "A Natural History of The Future", apresenta essa e outras leis da biologia e antecipa o que devemos esperar se mantivermos os padrões que caracterizam o Antropoceno.

A boa notícia é que a vida não está ameaçada. Mesmo que o planeta esquente 4° C e espalhemos venenos por todos os lados, algumas espécies prosperarão. O problema é que serão espécies que não nos interessam, como bactérias resistentes e mosquitos transmissores de arboviroses, cujo nicho ecológico aumenta com o aquecimento global.

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