Independentemente do alcolumbre da vez, o pacto que une governo Bolsonaro e o consórcio entre Progressistas, de Ciro Nogueira e Arthur Lira, e PL, de Valdemar da Costa Neto, não foi firmado para sutilezas. E todos os pachecos estão — serão — contemplados.
Previsão para 2022: R$ 37 bilhões, aí contidos os intocáveis mais de R$ 16 bilhões em emendas do relator. Valor que já considera os vetos miúdos de Bolsonaro, para pouco além de R$ 3 bilhões, montante que fica bem longe dos cerca de R$ 9 bilhões necessários à recomposição dos gastos obrigatórios que o Congresso, em parceria com o Planalto, propositalmente subestimou.
Foi sancionada, porém, a rubrica — da ordem de R$ 1,7 bilhão — que planta a projeção de reajuste salarial seletivo para as categorias do funcionalismo federal que compõem a base de apoio do bolsonarismo. E agora se especula sobre se parte dos bilhões vetados por Bolsonaro servirá para bancar aumento mais amplo. Alguém duvida? Falei em parte dos bilhões porque é provável que uma fatia da grana sirva à necessidade de se remontar o valor do Fundo Eleitoral àquele originalmente inscrito na LDO: R$ 5,7 bilhões, em vez dos pouco menos de R$ 5 bilhões que um puxadinho acomodara na LOA.
Para onde quer que se olhe, prioridades definidas, a galera sai ganhando. Jair “o Parlamento está muito bem atendido conosco” Bolsonaro já disse: “Hoje em dia estão todos ganhando”.
Um leitor me perguntou por que não escrevo sobre as eleições. Respondo: não faço outra coisa aqui senão falar da pré-campanha desde há muito deflagrada. E hoje de novo; dedicando-me particularmente à cobertura do governo Bolsonaro, sobretudo a partir de suas escolhas econômicas, em sua dimensão única: a de uma máquina dirigida tão somente à busca — irresponsável — do presidente pela reeleição, meta para a qual trabalha incondicionalmente o ministro da Economia.
Não me parece haver “sobre as eleições” mais importante do que a investigação acerca da forma como o governo e seus sócios no Parlamento —com o aval de Paulo Guedes — têm manejado dinheiros públicos e sacrificado a disciplina fiscal em função do objetivo de permanecer no poder. Não haverá algo mais relevante, com maiores impactos sobre o cidadão, do que a execução, ainda a meses das eleições, de um Orçamento, destelhado o teto de gastos, concebido e erguido sobre dois pilares, o corporativista e o eleitoreiro, conforme já expressaram a PEC dos Precatórios e seu tripé do esculacho fiscal, e agora sob a gestão patrimonialista de Ciro Nogueira.
E então, arrombada a porteira, chegamos à PEC dos Combustíveis, cuja pretensão consiste em baixar a inflação no trimestre que antecederá as eleições. Zeram-se os tributos federais, arma-se pressão sobre os governadores e alcança-se, com sorte, queda ínfima dos preços nas bombas. Com sorte porque não se pode descartar a chance de essa margem ser embolsada pela cadeia produtiva, ou mesmo anulada pelo aumento da cotação do barril de petróleo no mercado internacional.
Ninguém quer falar sobre câmbio apreciado; e sobre quanto disso — a verdadeira vilania a descontrolar o custo do combustível no Brasil — será produto do combo instabilidade institucional gerada por Bolsonaro mais incompetência de Guedes e Campos Neto.
Todo esse conjunto eleitoreiro a contratar mais inflação no futuro e a estabelecer o descalabro fiscal como escolha de governo. Depois da farra com as despesas disparada pela PEC dos Precatórios, a zorra com as receitas a partir da PEC dos Combustíveis, erigida sobre uma tal folga na arrecadação promovida pelo imposto inflacionário. O governo à vontade para renunciar a R$ 50 bilhões e ainda jogando mais areia sobre o aterro em que jaz a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Mais uma emenda à Constituição que não exigiria contrapartida à perda de receita. Está na moda. É como vamos. Mais uma vez informados de que Guedes — “sem participar das tratativas” — não se opõe ao beiço na arrecadação. Está mesmo contente com a mágica que a inflação fez na mitigação do déficit. E avalia que não dá para “cruzar os braços”. Algo precisa ser feito para que o chefe seja competitivo. A escolha: o rombo nas contas públicas por uma maquiagem inflacionária que role a bomba adiante — mais uma vez — e não atrapalhe Bolsonaro até outubro.
Em sua coluna no portal Metrópoles, Igor Gadelha dá conta de um Guedes desanimado com o processo por meio do qual o governo a que serve o teria vertido de Posto Ipiranga em loja de conveniência. Desanimado, mas ainda fiador do cálculo eleitoreiro segundo o qual a degradação inflacionária será mais deletéria para a popularidade do capitão do que a ruína fiscal. E teremos as duas.
Foi Guedes quem se transformou em loja de conveniência.
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