A proteção assegurada desse modo a Bolsonaro por Augusto Aras, procurador-geral da República, contém, no entanto, duas contradições. Uma, óbvia, está na finalidade de (também) obstrução da Justiça por parte de quem deve combater esse recurso criminoso.
A segunda vem de Bolsonaro contra Bolsonaro: suas falas antivacinação infantil confirmam de viva voz as conclusões sobre sua perversidade intencional, as determinações aos vassalos Pazuello e Queiroga, a indução de tratamento impróprio. E, sinal definitivo logo ao início, a dispensa e depois, como agora, a protelação da compra de vacinas.
Por si só, esse novo capítulo da obra homicida de Bolsonaro seria suficiente para ações no Tribunal Internacional, na Corte de Direitos Humanos da OEA quando Luis Almagro for retirado de lá e na Comissão de Direitos Humanos da ONU. Mesmo que o Judiciário brasileiro venha a deixá-lo em paz com seus atos mortíferos, a cada é dia mais improvável que Bolsonaro e asseclas passem por inocentes, e livres de problemas, no exterior.
Mas tal probabilidade não decorre, como substituta, da atitude de Augusto Aras. Nesta surgiu o ponto de partida da pregação e da inoperância governamental comprometidas na situação de crianças indefesas, dezenas de milhões, ao adoecimento e demais riscos por falta do principal preventivo. Nem as esperáveis represálias internacionais atenuam o dever do Supremo de encarar a conduta de Aras com o rigor requerido pela gravidade.
Para não instaurar de imediato o inquérito subsequente à CPI, Aras pretextou a necessidade de investigações preliminares. Era, porém, o que já estava em suas mãos, nas conclusões da CPI, e aí levadas até muito adiante. O Supremo não endossou o desvio. Nem por isso a tramitação do caso tomou o rumo e o ritmo próprios de qualquer caso. E nesse mais prementes, por se voltar para quase 630 mil mortes, além das incontáveis subnotificações.
Silenciar ou desviar o extraordinário resultado da CPI consiste não só em impunidade, mas também em permissividade para a continuação de crimes contra a população. É o que fazem Bolsonaro, o ex-médico Marcelo Queiroga e o engavetador-mor Augusto Aras, três aventureiros do cinismo e da exploração criminal do Estado e dos poderes de governo.
Os prazos fixados pelo Supremo, para certas medidas de Bolsonaro e do Ministério da Saúde, foram um começo. Não o necessário em respeito às instituições ultrajadas por práticas criminosas, como provado pela CPI. E em igual respeito aos pais e mães, filhos, netos e avós, cientistas, médicos e enfermeiros, escritores e músicos, trabalhadores de todos os trabalhos, atingidos pela mortandade a que foi juntado, sim, um genocídio —ainda não cessado e agora dirigindo-se a crianças.
É puro ouro
O general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional, anulou suas sete autorizações para garimpo de ouro em áreas preservadas do Amazonas e onde vivem dezenas de povos indígenas. Assim justificou o recuo: "Considerando as novas informações técnicas e jurídicas, apresentadas diretamente ao GSI", e segue.A justificativa é falsa —velha característica das justificativas de Augusto Heleno.
Nada gerou informação nova sobre a área. Ou Augusto Heleno presenteou as concessões apesar do que sabia a respeito da área e dos privilegiados, ou as fez sem saber mais do que os interesses a serem agraciados. Nas duas hipóteses, cometeu prevaricação. Mais uma delinquência.
A anulação se deu, meio às pressas, em vista da decisão de Lucas Furtado, um procurador da República de olhos abertos: investigar no Tribunal de Contas as concessões a grupos já embargados pelo Ibama e a chefes de garimpo ilegal com dragas fluviais.
Investigar o motivo dessas concessões, e de mais 74 feitas antes por Augusto Heleno, aborreceria organizações originárias de São Paulo e Rio, mas seria muito interessante. Na política, na Justiça e na caserna.
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