Porém, um estudo realizado com uma amostra global de 166 países de 2010 a 2020, revisto por pares e publicado na revista Sociology of Religion (Universidade de Oxford) desafia tais tentativas de explicação, e aponta antes para um fator aparentemente surpreendente. Afinal o que determina a vitalidade cristã nas sociedades estará relacionado com a medida em que os governos dão apoio oficial às igrejas em termos legais e políticos. Ou seja, quanto maior for esse apoio governamental mais se reduz o número de cristãos, uma relação que se mantém mesmo levando em conta as tendências demográficas gerais.
Note-se, porém, que tal apoio dos governos não deve ser confundido com liberdade religiosa ou direitos decorrentes da cidadania, mas apenas com privilégios atribuídos pelo estado às confissões.
Os autores do estudo, Nilay Saiya e Stuti Manchanda, falam em três paradoxos que ajudam a explicar o fenómeno. O primeiro é o do pluralismo. Embora em diversos setores da fé cristã se acredite que a melhor forma de ela prosperar seja a exclusão do espaço social das outras religiões, a verdade é que o cristianismo revela-se mais forte nos países em que se vê obrigado a competir com outras tradições de fé em igualdade de oportunidades. Adam Smith ajudaria a explicar o paradoxo através do exemplo da economia de mercado que estimula a competição, a inovação e o vigor entre empresas concorrentes. De igual modo seria de esperar que o mercado religioso não regulamentado tivesse efeito idêntico nas instituições religiosas. A pesquisa revela que em sete dos dez países do mundo nos quais a população cristã cresce mais rapidamente não existe praticamente apoio oficial ao cristianismo.
O segundo paradoxo é o do privilégio. Nove dos dez países que revelam o declínio mais rápido da população cristã no mundo oferecem os maiores apoios públicos às igrejas. Esses privilégios podem incluir financiamento do estado para fins religiosos, acesso especial a instituições do estado e isenções de regulamentos impostos a grupos religiosos minoritários. Portanto, se a competição entre religiões estimula a vitalidade cristã, o favoritismo estatal às igrejas compromete essa vitalidade, decerto contra a intenção dos governos.
As igrejas favorecidas podem até utilizar a sua posição de privilégio para exercer influência sobre a sociedade, mas isso apenas sucede por via de rituais e símbolos, como uma religião civil e não pelo fervor espiritual. Os casos históricos no âmbito do protestantismo são imensos na Europa, desde o Reino Unido com a Igreja de Inglaterra aos países escandinavos com o luteranismo. Mas o fenómeno verifica-se igualmente nos países de tradição católica como Portugal, Espanha, Bélgica e Itália, onde durante o século vinte os governos discriminaram ativamente os não católicos nas áreas de direito da família, radiodifusão religiosa, política tributária e educação. Coisa semelhante acontece na Rússia com a igreja ortodoxa.
O terceiro paradoxo é o da perseguição. Já no século II Tertuliano dizia que “o sangue dos mártires é a semente da igreja”. A fé cristã cresce rapidamente em diversos países muçulmanos, como o Irão e o Afeganistão, onde sofre uma perseguição duríssima. Também a China vive um crescimento exponencial. O sociólogo das religiões Fenggang Yang afirma que desde a década de 50 o cristianismo protestante cresceu 23 vezes, prevendo que em 2030 a China terá mais cristãos do que qualquer outro país no mundo e em meados do século metade da China poderá ser cristã.
É por isso que os partidos populistas de direita, apesar de alcançarem ganhos eleitorais momentâneos em nome duma defesa da “nação cristã” (resta saber o que será isso…), a prazo estarão apenas a contribuir para um declínio mais acentuado da fé na Europa.
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