A apatia política tem agravado a desigualdade na sociedade brasileira. Ao documentar em estudo a década perdida no combate à pobreza e à desigualdade, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que Executivo e Legislativo não atuaram com a agilidade necessária para adaptar a rede estatal de proteção social às circunstâncias do longo ciclo recessivo dos últimos cinco anos.
Quando foi mais necessário ampliar a transferência de recursos aos mais pobres, os principais veículos disponíveis — Bolsa Família e Benefício de Prestação Continuada (BPC) — demonstraram ser ineficazes. Outros programas de cunho social, como seguro-desemprego, abono salarial ou seguro-defeso, também ficaram aquém do desafio.
Não houve preocupação ou iniciativa para modificar nossa rede de combate à pobreza e à desigualdade numa situação de crise fiscal profunda. Resultado: 13,6 milhões de pessoas vivendo na pobreza extrema, na estimativa do IBGE divulgada na quinta-feira. Por qualquer ângulo que se se analise, o quadro é dramático. O Nordeste, com 27% da população, concentra 60% dos mais pobres.
“Todos os indicadores, sem exceção, contam a mesma história: a pobreza vinha melhorando até 2014 e piora abruptamente”, constataram os pesquisadores Rogério Barbosa, Pedro Ferreira de Souza e Sergei Soares. A partir de 2015, a desigualdade volta a avançar, mostra a análise dos dados de renda domiciliar.
É eloquente o aumento dos que vivem em pobreza extrema (renda máxima de R$ 89 per capita, pelo critério do Bolsa Família). Em 2018 havia 2,4 milhões — ou 38% — a mais nessa situação do que em 2012. Entre 2014 e 2018, 3,8 milhões ingressaram nessa faixa —crescimento de 80% em quatro anos.
O sistema de proteção social tem virtudes inegáveis. Mas, postos à prova, tanto Bolsa Família quanto BPC e seguro-desemprego se revelaram pouco eficazes para conter o estrago no mercado de trabalho. “Na realidade, o programa chegou a encolher nos anos de crise”, dizem os pesquisadores.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, fala em estender o auxílio emergencial ante uma nova onda da pandemia. Ipea e IBGE mostram que esse não é o único ponto, nem o principal. Programas sociais são necessários não apenas em momentos de crise. Não existem para inflar popularidade do presidente, mas para tirar a população da miséria. Para isso, precisam respeitar os limites fiscais do Estado. Do contrário, o risco é o retorno da inflação, maior de todos os geradores de desigualdade.
A fragilidade econômica impõe urgência na reformulação de programas como Bolsa Família, BPC ou seguro-desemprego, para dar-lhes a eficácia desejada. Governo e Congresso deveriam sair da apatia e redesenhar a rede de proteção social, pois a perspectiva é de agravamento da crise. Quem não tem renda tampouco tem poder, mas não pode ser deixado para trás.
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