O futuro não será brilhante para a economia global depois que a devastadora covid-19 deixar de ser uma ameaça relevante. Apesar da recuperação a curto prazo, esperada depois de estímulos fiscais e monetários formidáveis, a pandemia deixará marcas que demorarão a cicatrizar - o aumento da pobreza e da desigualdade, dívidas muito elevadas e destruição de capital humano são as mais evidentes. As projeções para o quinquênio, até 2025, feitas antes e depois do vírus, mostram um “severo revés no ritmo projetado de melhoria do nível de vida médio em todos os grupos de países”, aponta o Panorama Econômico Mundial divulgado pelo Fundo Monetário Internacional.
Mesmo o panorama do curto prazo é recheado de dúvidas. Para o FMI, o quarto trimestre mostra desaceleração do impulso ao crescimento, forte o suficiente no terceiro trimestre para que a instituição revisse a expansão global em 2020 para 4,4%, uma melhoria de 0,8 ponto percentual. No cenário de base, a projeção para 2021 é de 5,2%. Até agora, a produção industrial em vários países não voltou aos níveis pré-pandemia. A reação dos serviços, ao contrário de outras crises, é muito pior. “A escala da ruptura indica que, sem vacina e terapias efetivas, esse setor terá um caminho particularmente difícil para voltar a qualquer aparência de normalidade”, registra o Panorama.
O terceiro trimestre mostrou uma recuperação forte da atividade global como resposta a estímulos nunca vistos. Os países avançados gastaram 9% do PIB em medidas fiscais e 11% do PIB em apoio à liquidez, em média. O esforço dos emergentes foi, em geral, menor, com 3,5% e 2%, respectivamente. As despesas do Brasil foram superiores às deste grupo, perto de 9% do PIB%.
O cenário principal do Fundo contempla a descoberta de uma vacina ao longo de 2021, quando ainda estarão vigorando medidas de distanciamento social e lockdowns, e progressiva imunização que poderá garantir baixos níveis de contágio ao fim de 2022. Nesse ambiente, a recuperação só será vigorosa em relação à recessão de 2020. O crescimento previsto para EUA em 2021 (3,1%), Europa (5,2%) e América Latina (3,6%) será insuficiente para voltar ao nível anterior - -4,3%, -8,3% -8,1% respectivamente. O PIB brasileiro recuará 5,8% este ano e aumentará 2,8% no ano que vem, uma das reações mais fracas entre países relevantes.
O estado de saúde da economia global poderá ser melhor se o apoio fiscal for elevado, houver melhoria significativa da produtividade, ou se uma vacina se tornar efetiva antes do previsto. Os riscos de piora são mais numerosos, como a ressurgência do vírus, uma retirada abrupta dos estímulos, um aperto das condições financeiras motivada, por exemplo, por crises de dívida, aperto de liquidez decorrente de falências em série, tensões geopolíticas, incertezas sobre políticas comerciais e mesmo revoltas sociais.
Mas os países carregarão por muito tempo o peso da destruição provocada pelo coronavírus. Os países avançados, estima o FMI, terão seu potencial de expansão 3,5% menor do que o previsto antes da pandemia, com recuo ainda maior para os emergentes (-5,5%). Até 2025, o crescimento dos países desenvolvidos se estabilizará em torno de 1,7%, e o de emergentes, em 4,7% (5,6% na média 2000-2019).
As perdas para o Brasil são pesadas. Seu PIB per capita declinou 6,4% e só 2,2% dele será recuperado em 2021. O desemprego deve aumentar de 13,4% para 14,1%. O hiato do produto, de altos 5%, na média 2020-2021, cairá apenas à metade na média de 2022-2023.
Para países emergentes muito endividados, como o Brasil, que não é citado, o FMI deixou de lado seu receituário ortodoxo. O Fundo recomenda que gastos públicos ajudem a elevar o potencial de crescimento e a proteção aos vulneráveis. “A dívida adicional para financiá-los provavelmente se pagará por si mesma ao longo do caminho” com a recuperação da economia e aumento de impostos. E, em ressalva importante, indica que “mesmo que regras fiscais restrinjam essas ações, a suspensão temporária delas pode ser assegurada” se combinada ao compromisso de sua restauração a médio prazo. Há como arrumar recursos para essas finalidades, sugere o FMI, “reduzindo desperdícios com subsídios mal calibrados”. Se necessário, o aumento de impostos deve ser concentrado nas altas rendas, ganhos de capital e taxação sobre as empresas. Para fazer tudo isso, será preciso apresentar um plano crível de consolidação fiscal para quando a crise acabar.
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